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domingo, 6 de março de 2011

SILVIA APARECIDA SANTOS DE CARVALHO











O ENSINO DA LEITURA E DA ESCRITA:
O IMAGINÁRIO REPUBLICANO (1890-1920)












MESTRADO EM EDUCAÇÃO: HISTÓRIA E FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
1998


SILVIA APARECIDA SANTOS DE CARVALHO











O ENSINO DA LEITURA E DA ESCRITA:
O IMAGINÁRIO REPUBLICANO (1890-1920)



Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de MESTRE em Educação: História e Filosofia da Educação, sob orientação da Profª. Drª  Mirian Jorge Warde.




PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
SÃO PAULO - 1998















FICHA CATALOGRÁFICA

AUTOR: CARVALHO, Silvia Aparecida Santos de
TÍTULO: O Ensino da Leitura e Escrita: o Imaginário Republicano (1890-1920)
Nº DE FOLHAS: 110
ILUSTRAÇÕES: 22
GRAU: Mestrado
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: História e Filosofia da Educação
ORIENTADOR: Profª Drª Mirian Jorge Warde
PALAVRAS-CHAVE:






                                                    












                                                            BANCA EXAMINADORA

____________________________________________
____________________________________________
____________________________________________


RESUMO

A presente dissertação tem por objetivo analisar como foi organizado e concebido o ensino de leitura e escrita, em São Paulo, no período pós-proclamação da República no Brasil (1890-1920).
A partir de uma incursão na literatura especializada de época, apresenta um efervescente debate acerca dos métodos de ensino de leitura e escrita. Este debate, desenvolve-se entre defensores do método analítico pela sentenciação, defensores do método analítico pela palavração, defensores do método sintético pela soletração e defensores do método sintético pela silabação.
Além disso, apresenta quais os argumentos que, trazidos da marcante contribuição da ciência psicológica, justificaram, após o debate entre os defensores dos diferentes métodos, a escolha oficial do método analítico como o método mais adequado para encaminhar a formação republicana, determinada pela Diretoria Geral da Instrução Pública.
A presente dissertação apresenta também, o exame de uma possível correlação entre as disputas metodológicas acerca do ensino de leitura e escrita e as disputas ideológicas acerca dos diferentes projetos de construção da República. Com uma breve exposição dos projetos jacobinista, liberal e positivista, demonstra a predominância da vertente positivista na produção das teses de que a República para constituir-se como regime necessita de cidadãos leitores; que ao ensino da leitura e escrita deve estar agregado um ensino moral e cívico capaz de formar o cidadão com uma mentalidade, uma certa moralidade, um certo corpo de condutas compatíveis com a vida republicana; e que o método capaz de melhor formar o cidadão republicano é o método analítico para o ensino da leitura e escrita.



ABSTRACT

The present dissertation has the aim of analyse how was organized  and realized the reading and writing teaching, in São Paulo, during the period that comes after Republic proclamation of Brazil (1890-1920).
A deeper study on the specialized literature of the time, show us an expressive debate about the reading and writing teaching methods. This debate is developed among analytic method defensors initiate by conplete sentences, analytic method defensors initiate by words, synthetic method defensor initiate by spelling and synthetic method defensors initiate by sillable.
It presents also which arguments that coming from an weighty contribution from Psychology, justified after the debate among the defensors of several methods the official preference of the analytic method as a more suitable method to conduct a Republic forming determined by the Public Instruction General Management.
Farther on it presents an examination concerning to a possible correlation among methodologics disputes about differents projects to form the Republic. With a breef exposition of jacobinist, liberal and positivist line on the production of thesis that defend that the Republic, to consist in a political system it is necessary produce readers citizens; that to the reading and writing teaching should be envolved a moral and patriotic teaching able to form a citizen with a mentality, a morality with behavior according to republic life, and that the best method able to form the Republic citizen is the analytic method to the reading and writing teaching.



























À mamãe, pelas belas e  fantásticas histórias, com as quais ingressei no mundo da aprendizagem da leitura e da escrita.
Ao meu pai, que nas contradições da vida ensinou-me a valorizar o conhecimento.
À Kátia, irmã e companheira  intrépida no aprendizado da vida.
À Francisco, meu amor e companheiro,  apoio de todas as horas.



AGRADECIMENTOS

À Mirian Jorge Warde, pela orientação, sem a qual não seria possível a realização do presente estudo, meu profundo respeito, admiração e gratidão. 

Aos mestres Luis Carlos Barreira e Maria Helena B. Granjo, pelos conhecimentos ministrados nas disciplinas História da Educação Brasileira e Tendências do Pensamento Educacional, com os quais pude alicerçar o presente estudo.

À Nedina Stein, pela amizade e companheirismo indissolúveis, apesar da distância.

Às colegas Célia, Mariléia, Alice e Ivanise, com as quais pude desabafar minhas inseguranças e aflições acadêmicas.

À Profª Drª Denice Bárbara Catani, pelos conhecimentos ministrados no Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação: História e Filosofia da Educação da Universidade de São Paulo.

À Fernando Flogliano e ao Programa de Estudos Pós-Graduados em Comunicação e Semiótica da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, pelo trato tecnológico dado às figuras apresentadas nesta dissertação.

À Profª Vânia, pelos conhecimentos de língua inglesa.








SUMÁRIO

Introdução............................................................................................................................... 13


Capítulo I
O método analítico e o método sintético para o ensino da leitura e escrita: projetos em disputa na construção da República.................................................................................................................................. 19


Capítulo II
A oficialidade do Método Analítico: aprendendo a ler entendendo o que se lê, para tornar-se cidadão 53


Capítulo III
O imaginário republicano e o ensino da leitura e escrita........................................................... 96


Considerações Finais............................................................................................................. 104


Bibliografia............................................................................................................................ 106



FIGURAS

Figura 1.1
Lição da Cartilha Moderna, de Ramon Roca Dordal .............................................................. 25


Figura 1.2
Lição da Cartilha Moderna, de Ramon Roca Dordal .............................................................. 27


Figura 1.3
Lição da Cartilha Moderna, de Ramon Roca Dordal .............................................................. 28


Figura 1.4
Lição proposta por João Kopke a partir de uma ilustração da Cartilha Moderna, de Ramon Roca Dordal .................................................................................................................................................. 32


Figura 1.5
Lição proposta por João Kopke a partir de uma ilustração da Cartilha Moderna, de Ramon Roca Dordal .................................................................................................................................................. 33


Figura 2.1
Orientação para aplicar o método analítico a partir das lições da Cartilha das Mães, de Arnaldo Oliveira Barreto .................................................................................................................................................. 61


Figura 2.2
Orientação para aplicar o método analítico a partir das lições da Cartilha das Mães, de Arnaldo Oliveira Barreto .................................................................................................................................................. 61

Figura 2.3
Lição da Cartilha das Mães, de Arnaldo Oliveira Barreto ...................................................... 62


Figura 2.4
Lição da Cartilha das Mães, de Arnaldo Oliveira Barreto....................................................... 63



Figura 2.5
Lição da Cartilha das Mães, de Arnaldo Oliveira Barreto....................................................... 64


Figura 2.6
Lição do 1° Livro de Leituras Morais e Instrutivas, de João Kopke......................................... 67


Figura 2.7
Lição do 1° Livro de Leituras Morais e Instrutivas, de João Kopke......................................... 68


Figura 2.8
Lição do 1° Livro de Leituras Morais e Instrutivas, de João Kopke......................................... 69


Figura 2.9
Lição do 1° Livro de Leituras Morais e Instrutivas, de João Kopke......................................... 70


Figura 2.10
Lição do 1° Livro de Leituras Morais e Instrutivas, de João Kopke......................................... 71


Figura 2.11
Lição do 1° Livro de Leituras Morais e Instrutivas, de João Kopke......................................... 72


Figura 2.12
Lição do1° Livro de Leituras Morais e Instrutivas, de João Kopke.......................................... 73


Figura 2.13
Lição do 1° Livro de Leituras Morais e Instrutivas, de João Kopke......................................... 74


Figura 2.14
Lição do 1° Livro de Leituras Morais e Instrutivas, de João Kopke......................................... 75


Figura 2.15
Modelo de aplicação de método analítico................................................................................ 80


Figura 2.16
Modelo de aplicação de método analítico................................................................................ 81

Figura 2.17
Modelo de aplicação de método analítico................................................................................ 82


Figura 2.18
Modelo de aplicação de método analítico................................................................................ 83


Figura 2.19
Modelo de aplicação de método analítico................................................................................ 84


Figura 2.20
Modelo de aplicação de método analítico................................................................................ 85


Figura 2.21
Modelo de aplicação de método analítico................................................................................ 86


Figura 2.22
Modelo de aplicação de método analítico................................................................................ 87













QUADROS

Quadro 1.1 - Artigos sobre “ensino da leitura e escrita”
Revista de Ensino -1902-1918............................................................................. 20


Quadro 1.2 - Programa de Ensino das Escolas Preliminares
Decreto nº248 - 26/07/1894................................................................................. 40


Quadro 1.3 - Programa de Ensino dos Grupos Escolares e Escolas-Modelo
                     Decreto nº1217 - 29/04/1904............................................................................... 41


Quadro 1.4 - Programa de Ensino das Escolas-Modelo Isoladas
                     Decreto nº2005 - 13/02/1911............................................................................... 48


Quadro 1.5 - Programa de Ensino das Escolas de Bairro
Decreto nº2368 - 14/04/1913............................................................................... 49


Quadro 2.1 - Programa de Ensino de Moral e Cívica para as Escolas Preliminares
Decreto nº248 - 26/07/1894................................................................................. 65


Quadro 2.2 - Programa de Instrução Cívica e Moral para Grupo Escolares e
Escolas Modelo - Decreto nº1217 - 29/04/1904.................................................. 66


Quadro 2.3 - Programa de Educação Cívica para Escolas de Bairro -
                     Decreto nº2368 - 14/04/1913............................................................................... 66







Introdução






O ensino da leitura e escrita, desde a proclamação da República, tem ocupado uma posição relevante no conjunto de assuntos relacionados à educação no Brasil. Temas como: a erradicação do analfabetismo, os aspectos psicológicos e cognitivos envolvidos na aprendizagem da leitura e escrita e a contribuição das metodologias de ensino são consideravelmente reincidentes no debate que, ao longo da História da Educação Brasileira, ocupa-se do assunto.
Tradicionalmente, a literatura relativa a essa temática é marcada por análises que focalizam privilegiadamente os aspectos psicológicos, cognitivos e metodológicos das aprendizagens básicas, revelando por sua vez, uma tendência em abordar o ensino de leitura e escrita descolado do tempo histórico.
Atualmente, essa tendência vem sendo revertida; a preocupação com a recuperação histórica das práticas de alfabetização está sendo compartilhada por vários autores. Em verdade, esta temática está inserida numa perspectiva mais ampla: a recuperação de práticas culturais de leitura e escrita.
Soares apresenta a relação entre língua escrita, sociedade e cultura como objeto de análise sob, pelo menos, dois pontos de vista: o primeiro trata essecialmente da

diacronia das conexões entre escrita, sociedade e cultura. Deste ponto de vista, a busca dos elos entre língua escrita, sociedade e cultura volta-se para os momentos históricos e aspectos antropológicos da emergência e progressiva socialização da língua escrita em sociedades e culturas, analisando a característica da oralidade anterior à escrita, os processos de transição da oralidade à escrita, os processos de mudanças sociais, cognitivas e comunicativas resultantes da introdução da língua escrita em sociedades de oralidade primária, as práticas de leitura e escrita em diferentes épocas e diferentes grupos sociais, os processos históricos de acumulação, difusão e distribuição do material escrito, o surgimento da imprensa e seus efeitos, etc. (Soares, 1990, p.6).


O segundo ponto de vista, concentra-se

na análise dos aspectos sincrônicos (...) tomando naturalmente, as lições da diacronia como quadro de referência, volta-se para o exame do papel e do lugar da língua escrita nas modernas sociedades e culturas letradas, grafocêntricas, sociedades de “oralidade secundária” buscando as dimensões da leitura e da escrita nessas sociedades e culturas, as relações entre a escrita e os valores, representações e solicitações dessas sociedades e culturas, e, conseqüentemente, as perspectivas conceituais e teóricas segundo as quais essas dimensões e relações podem ser analisadas. Em outras palavras, busca-se o significado do alfabetismo nas sociedades e culturas letradas (Soares, 1990, p.6).


Soares ainda desenvolve o conceito de alfabetismo em duas grandes dimensões: a individual que focaliza o alfabetismo como um tributo pessoal, referindo-se a posse individual do domínio das técnicas de leitura e escrita, e a social, em que o conceito de alfabetismo é entendido como fenômeno cultural. Afirma também, que o conceito de alfabetismo depende de como a leitura e a escrita são praticadas num determinado contexto social. Assim o alfabetismo pode ser entendido como um conjunto de práticas governadas pela concepção de o que, como, quando e por quê ler e escrever (Soares, 1995, p.11).
Viñao Frago contribui na mesma direção. Ao referir-se à leitura e à escrita como práticas culturais, considera que a investigação histórica da leitura e da escrita deve dirigir-se

... aos modos e maneiras de ler e escrever, à sua aprendizagem, aos objetos e instrumentos utilizados, aos tempos e lugares em que se dão, às motivações, representações e imagens mentais dos que escrevem e lêem e a certo tempo de leituras e atos de escrita até agora considerados cientificamente não relevantes ... (Viñao Frago, 1993, p.88).


Viñao Frago ainda considera que, para a história da leitura, interessa definir o leitor como recriador de textos e entender que o ato de ler encerra uma atividade de produção de significados e sentidos diferençados de um determinado texto. Desse modo, para o autor, a história da leitura, torna-se a história do modo como são criados e apropriados os significados e sentidos de um texto impresso. Uma história da prática de leitura deve, pois, estar atenta aos

suportes materiais e anexos ao texto; não só ao conteúdo em si mesmo, mas também aos significados introduzidos, modificados ou eliminados em cada caso pelo editor, impressor, crítico, livreiro ou pelo próprio leitor através, por exemplo da edição, tipografia, formato, diagramação ou distribuição do texto, ilustrações, notas, informação facilitada, publicidade, localização espacial para sua comercialização e venda ou sinais de leitura. Tudo isso, com o fim de apreciar alguns destes múltiplos e diversos significados possíveis e captar a variabilidade e mudança nos modos e maneiras de ler em geral ou, em relação com determinados textos concretos, de  utilizá-los e consumí-los, em suma, de apropriar-se deles (Viñao Frago, 1993, p.89).

Moysés também agrega grande contribuição para essa perspectiva de análise. Segundo a autora, o ideário republicano considera o letramento e a instrução como condição fundamental para a cidadania e modernização do país. Embora entendendo que as mudanças ocorridas na sociedade brasileira do final do século XIX não lhe sejam exclusivas, estas, por sua vez, desencadeiam transformações que lhe fornecem um perfil específico. Para Moysés, essas transformações são de fundamental importância para a evolução cultural da época, pois estão articuladas, principalmente, a transformações de comportamentos e hábitos e no modo como os grupos sociais apropriam-se de um conhecimento. Para a autora,

Recuperar as imagens de leituras e leitores, buscar traços e gestos, esquecidos, marcas perdidas, significa reconstituir as representações dessa sociedade no seu acesso à cultura escrita. Como imagens de uma época, “atravessam o texto, transformando-os; atravessados por elas, os textos se transformam”, (Marin,1992) reconstituindo contrastes e significações. Assim configurá-las (Elias,1991) significa considerá-las historicamente como situações onde os individuos são atores e não entidades abstratas e hierarquizadas por estruturas e posições, e, por isso representam a si mesmos, seus valores, conflitos e aspirações (Moysés, 1995, p.54).


Soares, Viñao Frago e Moysés, apresentam perspectivas de investigação histórica das práticas culturais de leitura e escrita que são complementares. A elas podem-se somar as considerações de Hèbrard (1990). O autor apresenta as dificuldades de delimitação de um campo de pesquisa que se ocupa com a evolução das práticas e dos saberes elementares. O autor pergunta,

Há um lugar para os saberes elementares numa história das disciplinas? A resposta imediata é sempre dubidativa; esses saberes, que se transmitem nas e pelas instituições dedicadas às primeiras aprendizagens, são savoir-faire, sem correspondentes nas ciências e sua hierarquia. Assim, não existiu no século XVI, nem existe hoje, no campo das disciplinas universitárias, ao lado da matemática ou da geografia, um campo de estudo cujo objeto específico fosse a leitura (Hèbrard, 1990, p.65).


Na tentativa então, de contribuir para a constituição deste campo, decidi dedicar atenção ao estudo histórico das práticas de alfabetização. Examinando a literatura disponível sobre a história da educação brasileira, verifiquei que, com a proclamação da República, é conferido ao ensino da leitura e escrita uma importância fundamental para a viabilização do regime republicano. Conforme os autores consultados, através do ensino de leitura e escrita deveria ser ministrado um conteúdo moral e cívico capaz de formar o novo cidadão para viver numa nova nação. Nas palavras de Carvalho,

Regenerar as populações brasileiras, núcleo da nacionalidade, tornando-as saudáveis, disciplinadas e produtivas, eis o que se esperava da educação erigida nesse imaginário em causa cívica. Regenerar o povo brasileiro era dívida republicana a ser resgatada pelas novas gerações (...) O analfabetismo passava a ser a marca de inaptidão para o progresso. Ele era a causa da existência das populações que “mourejavam no Estado” sem ambições, indiferentes, de todo em todo as cousas e homens do Brasil (Carvalho, 1989, pp.10 e 40).


Para Ribeiro, o índice de analfabetismo no período pós-proclamação da República variava entre 85% em 1980 e 75% em 1920 (Ribeiro, 1993, p.81). Além disso, refere-se à importância conferida ao ensino cívico e patriótico agregado ao ensino da leitura e escrita.

Com a sociedade brasileira se desenvolvendo em base urbano-comercial desde a metade do século XIX, (...) as técnicas de leitura e escrita vão se tornando instrumentos necessários à integração em tal contexto social. (...) Campanhas proclamando a necessidade da difusão da escola primária foram organizadas. Eram lideradas por políticos que, enquanto tais, reconheciam a necessidade de difusão especialmente da escola primária como base da nacionalidade, o que fez com que alguns defendessem não só o combate ao analfabetismo, como também a introdução da formação patriótica, através do ensino cívico (Ribeiro, 1993, pp.82 e 83).


Nagle, em seu alentado estudo sobre a educação na Primeira República, apresenta as seguintes considerações a respeito do tema:

Da luta contra a “aristocracia dos que sabem ler e escrever” passa a batalha contra o analfabetismo, pois “É de todos sabido que o analfabetismo no Brasil oferece condições desoladoras, que a vontade nacional se substitui pela vontade de uma minoria insignificante que fala, vota e determina.” Alfabetizar significa proporcionar a aquisição de direitos políticos, pois de acordo com o Art. 70, parágrafo 2º  da Constituição, o analfabeto não pode manifestar sua vontade política. (...) Em síntese, os quadros do pensamento apresentam a seguinte formulação: a ignorância reinante é a causa de todas as crises; a educação do povo é a base da organização social, portanto, o primeiro problema nacional; a difusão da instrução é a chave para todas os problemas sociais, econômicos, políticos e outros (cf. Mario Pinto Serva. A Educação Nacional) (Nagle, 1974, p.263).


Motivada, então, a verificar como foi organizado o ensino de leitura e escrita no período pós-proclamação da República, realizei uma incursão na literatura especializada da época: as leis e decretos do ensino público paulista, no período de 1890-1920; a Revista de Ensino - Órgão da Associação Beneficente do Professorado Público de São Paulo, com publicação entre os anos de 1902-1918 (57 números); o Annuario de Ensino do Estado de São Paulo - publicação organizada pela Diretoria Geral da Instrução Pública por ordem do Governo do Estado, com edições entre os anos de 1907/1908, 1908/1909, 1909/1910, 1911/1912, 1913, 1914, 1915, 1916, 1917 - (1º e 2º volumes), 1918, 1919, 1910/1921; manuais de ensino relativos ao ensino de leitura e escrita; cartilhas de alfabetização compõem o conjunto dos materiais impressos analisados.
Após examinar os materiais acima referidos pude delimitar o estudo sobre o ensino da leitura e escrita no Estado de São Paulo entre 1890, data em que se iniciaram as reformas republicanas no ensino paulista, e 1920, data em que é autorizada a autonomia didática ao professorado paulista, depois de um longo debate a respeito de métodos de ensino de leitura e escrita.
Esse debate sobre métodos de ensino de leitura e escrita é apresentado no capítulo I. Defensores do método analítico que advogam a idéia de que o ensino de leitura e escrita deve ser iniciado pelo ensino da sentença e da palavra e defensores do método sintético que, ao contrário, advogam que o ensino de leitura e escrita deve ser iniciado pelo ensino da letra e da sílaba não economizam argumentos para qualificar sua opção metodológica como mais habilitada e capaz de formar o cidadão republicano.
Contudo, a Diretoria Geral da Instrução Pública de São Paulo determina que o método de ensino de leitura e escrita, capaz de melhor formar o cidadão republicano é o método analítico. Baseada em contribuições da Psicologia, bem como na possibilidade de viabilizar um conteúdo moral e cívico através das sentenças, as quais são utilizadas para iniciar o ensino da leitura e escrita, concede ao método analítico foros de oficialidade. Os argumentos que justificam esta opção são apresentados no capítulo II.
No capítulo III examina-se uma possível correlação entre as disputas metodológicas pertinentes ao ensino de leitura e escrita e as disputas ideológicas de projetos diferençados de construção do novo regime. Com uma breve exposição sobre os projetos jacobinista, positivista e liberal de constituição do regime republicano brasileiro, demonstra a predominância do projeto positivista na defesa das teses de que ensinar os cidadãos a ler e escrever é condição fundamental para a viabilização do regime republicano; que esse ensino deve visar a formação de uma certa mentalidade, uma certa moralidade, um certo corpo de condutas compatíveis com a vida republicana e, por fim, que não pode, por sua vez, ser qualquer ensino, mas orientado pelo método analítico.
O presente estudo é uma tentativa de contribuir para a escrita da História da Educação Brasileira. Mais do que isso, tem o intuito de historiar uma parte das práticas de alfabetização no Brasil, por julgar de grande importância a sistematização desse conhecimento para os estudiosos da educação brasileira, e, muito particularmente, para os que se ocupam da tarefa de alfabetizar.


Capítulo I

O método analítico e o método sintético no ensino da leitura e da escrita:
projetos em disputa na construção da República





A literatura especializada, publicada após a proclamação da República, apresenta um conjunto de informações fundamentais para se entender o modo como é organizado e concebido o ensino da leitura e escrita em São Paulo, entre os anos de 1890-1920.
Os artigos da Revista de Ensino, os relatórios dos inspetores escolares contidos no Annuario de Ensino do Estado de São Paulo e outras publicações da época, como as leis e os decretos do ensino público paulista, apresentam uma série de informações fecundas a cerca dos métodos de ensino da leitura e escrita, bem como da importância atribuída ao ensino da leitura e escrita para a viabilização do regime republicano.
Dentre os materiais impressos examinados, os artigos da Revista de Ensino  constituem foco norteador da análise a ser aqui apresentada. Eles patenteiam um debate entre defensores de diferentes métodos de ensino de leitura e escrita, que se desenvolve sustentado pela idéia de que o melhor método de ensino é capaz de formar o melhor cidadão republicano.
O texto que se segue expõe o desenvolvimento deste debate, considerando as  contribuições complementares contidas em outras publicações.
A Revista de Ensino apresenta, nas edições consultadas,  32 artigos referentes ao ensino da leitura e escrita, arrolados no quadro seguinte:
Quadro 1.1
 Artigos sobre o ensino da leitura e escrita - Revista de Ensino - 1902-1918
Autor
Título do Artigo
Edição
Romão Puiggari
A questão dos programmas
Ano I-abril -1902- nº1
 Joaquim Brito
Cartilha Moderna
Ano I-abril -1902- nº1
 Ramon Roca Dordal
Methodos de Leitura - Cartilha Moderna
Ano I-junho-1902- nº2
 Joaquim Brito
A seriação dos livros de leitura
Ano I-junho-1902- nº2
 Luiz Cardoso
Arte de Leitura e a Critica
Ano I-outubro-1902-nº4
 João Kopke
Ensino da Leitura (Carta aos Professores J. de Brito e R. Roca Dordal)
Ano I-outubro-1902-nº4
Arnaldo Oliveira    Barreto
Ensino da Leitura
Ano I-dezembro-1902- nº5
 Luiz Cardoso
Arte da Leitura e a Crítica
Ano I-dezembro-1902- nº5
 João Kopke
Ensino da Leitura
Ano I-fevereiro de 1903-nº6
 Luiz Cardoso
Arte de Leitura e a Critica
Ano II-fevereiro- 1904-nº6
 O.Carvalho
Arte de Leitura
Ano III -abril -1904- nº1
 João Kopke
Livros Escolares
Ano III-junho-1904-nº2
 Theodoro de Moraes
Leitura Analítica
Ano VIII-março-1909-nº1
 J. Carneiro da Silva
O Methodo Analytico
Ano VIII-junho-1909- nº2
 Carlos Escobar
A leitura analytica
Ano X-setembro-1911-nº2
 L. Charenton
De como desenvolver nas crianças o gosto pela leitura
Ano X-setembro-1911-nº2
             -
Methodos de ensino
Ano X-dezembro-1911-nº3
 Argymiro Acayaba
A propósito da Leitura Analítica
Ano X-dezembro-1911-nº3
 Guilherme Carabajal
O conceito de leitura
Ano X-dezembro-1911-nº3
 B.M.Tolosa
O ensino da leitura
Ano X-dezembro-1911-nº3
 Luiz Cardoso
Educação Analytica
Ano XI-junho-1912- nº1
 B. M. Tolosa
Em classe e para a classe - O ensino da leitura
Ano XI-junho-1912- nº1
 C. Braga
O ensino da língua materna
Ano XI-março-1913-nº4
 Ramon Roca Dordal
Em Classe e para a Classe
Ano XII-dezembro-1913-nº3
 Mariano de Oliveira, Ramon                      Roca Dordal e Arnaldo Barreto
Instrucções práticas para o ensino da leitura pelo Méthodo Analytico
Ano XII-março-1914-nº4
 Oscar Leme Brizolla
Pedagogia Prática - Pelo ensino
Ano XV-junho-1916-nº1
 Guilherme Kuhlmann
Educação Moral
Ano XV-março-1917-nº4
 B.M.Tolosa
Methodo Analytico para o ensino da leitura a principiantes
Ano XVI-junho e setembro-1917-nº1 e 2
 B.M.Tolosa
Pedagogia - O Ensino da Leitura pelo Methodo Analytico
Ano XVIII-junho a dezembro-1918-nº1 a 4
 B.M.Tolosa
Ensino da Leitura pelo Methodo Analytico
Ano XVIII-junho a dezembro-1918-nº1 a 4
 Raphael Cavalheiro
O Ensino Natural de Leitura
Ano XVIII-junho a dezembro-1918-nº1 a 4
 Raphael Cavalheiro
A intuição analytica no ensino da leitura
Ano XVIII-junho a dezembro-1918-nº1 a 4
Fonte: Elaborado com base nos artigos da Revista de Ensino de 1902-1918.


Já na primeira edição, abril de 1902, ano I, nº1, a Revista publica o primeiro artigo sobre o ensino da leitura e escrita - A questão dos programmas - assinado por Romão Puiggari. Nele, o autor aponta a importância da elaboração de um programa de ensino sistematizado, com a reunião - ou, como diz ele, com a “sistematização” - do que há de mais proveitoso nos métodos de ensino.

O impulso que tomou a escola publica foi de tal magnitude que já hoje dificilmente poderá deter-se em sua marcha. Devemos, pois, entrar francamente no período de systematisação. As forças, que com a maxima energia foram empregadas em combater os antigos processos, devem ser disciplinadas, arregimentadas em torno de um princípio indiscutível, tendendo todas para um fim unico. De um modo geral, podemos dizer, com toda a verdade, que tudo quanto ha de bom, tudo quanto ha de reconhecidamente proveitoso, em methodos de ensino, encontra-se esparso, aqui e alli, nas nossas escolas;(...). O período de organisação de todo e qualquer apparelho é um período revolucionário, mais ou menos anarchico. (...) É tempo, pois, de entrarmos no periodo de definitiva systematisação (Puiggari, 1902, p.13).

O autor destaca também os objetivos principais do ensino primário e o papel regenerador da escola:

O ensino primário deve (...) procurar o desenvolvimento sob os três pontos de vista: physico, intellectual e moral. Destes três pontos é o terceiro o mais importante.(...) A moral ensinada na escola não deve ser a moral abstracta, deve ser a moral applicada. A escola deve ser a modificadora dos defeitos da sociedade, do meio.(...)
O amor ao trabalho, a honestidade publica e particular, a altivez politica, o respeito ás autoridades, emfim, todas as virtudes que tornam um paiz forte e feliz, só podem vir da escola. Não virão de uma vez, transformando de um dia a outro os caracteres, mas, por isso mesmo, que o trabalho é lento é que nelle deve ser empregada mais tenacidade (Puiggari, 1902, pp.16 e 17).


Com o artigo de Puiggari, a Revista de Ensino aborda a importância da sistematização de novos procedimentos de ensino, bem como a função que deve ser atribuída ao ensino moral na escola primária. Se a escola republicana deve corrigir os defeitos da sociedade, tornando o país forte e feliz, a formação oferecida por ela deve também, abandonar os procedimentos rotineiros de ensino, sistematizando o conhecimento sobre os métodos com lições educativas, adequadas para alcançar tal objetivo. Para o autor, a reunião de novos procedimentos com lições de valor educativo possibilita, assim, a formação do cidadão para a nova sociedade.
Além do artigo de Puiggari, o nº1 da Revista de Ensino apresenta Cartilha Moderna, artigo assinado por Joaquim Brito, com o qual inicia-se a exposição de argumentos em defesa dos diferentes métodos de ensino de leitura e escrita. Neste, o autor trata dos métodos de ensino, das cartilhas e dos livros que em seu entendimento são os mais adequados ao desenvolvimento mental do aluno e ao ensino da leitura e escrita.
Com o artigo de Brito, desencadeia-se um debate que atravessa a maior parte dos artigos da Revista referentes ao ensino da leitura e escrita, no qual confrontam-se os métodos analítico pela sentenciação, analítico pela palavração, sintético pela soletração e sintético pela silabação.
O método analítico pela sentenciação inicia o processo de ensino da leitura e escrita pela sentença. Ao ensiná-la, o professor procede destacando as palavras que, depois de aprendidas pelos alunos, são desmembradas em sílabas que, por sua vez, são desmembradas em letras. O método analítico pela palavração inicia o processo de ensino da leitura e escrita pela palavra, obedecendo a partir disso o mesmo processo de ensino adotado pelo método analítico de sentenciação.
Ao contrário, o método sintético deve iniciar o processo de ensino, no caso da soletração, pela letra que, uma vez aprendida pelos alunos, deve constituir as sílabas. Após o aprendizado das sílabas, os alunos, com elas, devem formar as palavras e posteriormente as sentenças. No caso da silabação, o ensino da leitura e escrita deve iniciar-se pelo ensino da sílaba, obedecendo a partir disso o mesmo procedimento pelo método sintético de soletração.
Brito em seu artigo apresenta as vantagens do método analítico pela palavração utilizado na Cartilha Moderna de Ramon Roca Dordal e discorda de João Kopke que, em conferência realizada a 1º de março de 1896 no antigo edifício da Escola Normal de São Paulo[1], demonstra uma outra forma de aplicação do método analítico pela palavração. Os argumentos de Brito referem-se a inaplicabilidade do método de Kopke nas escolas onde o ensino é coletivo e nem todos os professores sabem desenhar. Além disso, Brito afirma que o método analítico de palavração apresentado pela cartilha supera o problema da decoração que, segundo o autor, é praticada abusadamente neste tipo de procedimento.

Sempre fomos inimigos do methodo de palavração americana introduzido por Miss Marcia Browne[2] e posto em pratica, a principio, em nossas escolas-modelo; isso não por espirito rotineiro mas pela convicção inabalavel de seu improficuo resultado(...)
Eis que apparece a - Cartilha Moderna - baseada tambem no methodo de palavração e vimo-nos obrigados, pela observação que fizemos, a acceital-a como uma das melhores, porquanto é baseada num methodo de palavração racional, lógico, sendo impossível, pela disposição dos elementos das lições, a decoração tão usada e abusada principalmente em tal methodo (Brito, 1902, p.322).


O autor esclarece também, sobre a disposição das lições da Cartilha Moderna, que após a síntese deve-se proceder a análise: uma vez que os alunos já aprenderam ler e escrever, a palavra deve ser decomposta em sílabas e letras.

As palavras aprendidas por meio de gravuras são logo empregadas em sentenças e historietas, além de serem decompostas em seus elementos. De maneira que apos a synthese vem a analyse, como uma prova a verificar si a lição foi comprehendida ou sabida. Alem disso, a disposição das palavras é feita de tal modo que se torna impossível a decoração. Depois, as difficuldades apparecem em doses homeopathicas que a creança quasi não as percebe e, atrahida pela gravuras e pelas historietas que lê, desde o começo, considera a Cartilha como um livro agradavel ...(Brito, 1902, p.323)

Na edição de junho de 1902, ano I, nº2, a Revista de Ensino apresenta o artigo de Ramon Roca Dordal, Methodos de Leitura - Cartilha Moderna, a partir do qual dedica-se ele próprio a apresentar o método analítico pela palavração utilizado em sua cartilha. Estimulado também pela conferência realizada em 1896, na Escola Normal de São Paulo, o autor pronuncia-se a respeito da relevância do método analítico pela palavração apresentado por Kopke.


Si pudessemos applicar ao ensino da leitura o methodo mais racional, aquelle que se impõe pela logica, seria sem duvida, o que o ilustre educador João Kopke patenteou ha alguns annos em notavel conferencia realizada no antigo edificio da Escola Normal desta Capital, perante numeroso auditorio, e a que o autor destas linhas teve a felicidade de assistir. Apresentar um desenho, esboçado rapida e elegantemente á vista do proprio alumno, e depois em palestra, alegremente ir animando-o, até que elle consiga conhecer, explicar, lêr e reproduzir os caracteres graphicos que compõem as sentenças que puderam ser formuladas a respeito desse desenho, e logo, compôr, com o proprio alumno, a historieta que o mesmo desenho inspirar, seria digo, a ultima palavra no ensino da leitura, constituindo, na phrase do distincto educador, o passo mais seguro na integralisação do ensino primario (Dordal, 1902, p.214).


Em contrapartida, apresenta suas discordâncias e a importância que assume o método, presente em sua Cartilha, para a superação das dificuldades encontradas na aplicação do método analítico pela palavração.

Mas, actualmente, mesmo durante muito tempo, será (...) possivel [a aplicação do método analítico de palavração apresentado por Kopke] nas escolas publicas? Não; nas escolas publicas não será isto possível tão cedo, pela unica razão de que nellas o ensino não póde ser individual, caso em que esse methodo satisfaz completamente, e mesmo porque todos os professores não possuem essa aptidão especial, que faça de cada um delles um desenhista notavel e um metodisador emerito.(...) O primeiro livro de leitura, pois, ha de ser illustrado; ha de conter figuras, desenhos nitidos e elegantes de objetos, animaes ou cousas que a criança conheça ou precise conhecer. A cartilha que não contiver desenhos, deve, sem mais discussão, ser posta de lado; (...) não corresponde mais ás necessidades do ensino moderno, não pode ser aceita por um mestre progressista (Dordal, 1902, pp.214 e 215).

Para o autor, a Cartilha Moderna supera as dificuldades encontradas no método apresentado por Kopke. Além de conter as gravuras adequadas para o ensino da leitura, adapta-se perfeitamente ao ensino coletivo. E como demonstração, o autor apresenta, em seu artigo, a primeira lição de sua cartilha:

                                            



                                            Figura 1.1
               Lição da Cartilha Moderna de Ramon Roca Dordal
      Fonte: Revista de Ensino, edição de junho de 1902, anoI,nº2.

Nessa primeira lição, esclarece o autor, os alunos devem inicialmente, olhar e descrever as figuras.
Já conhecendo algumas vogais, graças a exercícios anteriores, os alunos são encorajados a ler as palavras acompanhadas de cada desenho. Em seguida, podem ler as frases, com acompanhamento cuidadoso do professor. Dordal alerta também, para a importância da pontuação, bem como das letras maiúsculas. Para o autor, o professor ao ensinar a leitura deve cuidar para que o aluno seja capaz de

dizer uma sentença que exprima uma idéia completa, pontuada convenientemente, empregando maiusculas ao começal-a ou em seus nomes proprios si os contiver. A não ser isso, mutilar a sentença em qualquer destes pontos, será o que quizerem, mas não é um trabalho real - não é ensinar a lêr (Dordal, 1902, p.218).

Segundo Dordal, toda cartilha ao pretender ser adequada ao ensino da leitura e escrita, além de conter as gravuras e adaptar-se ao ensino coletivo, deve reunir os seguintes requisitos: método, cada lição deve ser um preparo da seguinte; rapidez, deve conter idéias e palavras que exprimam idéias claras; não deve apresentar dificuldades inúteis; deve estar ao alcance da inteligência infantil, contendo somente palavras simples, que exprimam fatos próprios da infância. A Cartilha Moderna reúne, segundo o autor, todos esses requisitos.
Vale a pena imaginar a reação dos alunos ao olharem para a figura que apresenta um menino nascendo do ovo! Como descreveram a figura? O que teriam pensado? Qual o significado que o próprio autor conferia a essa figura? Teria ele cogitado uma significação científica em contraposição a uma outra de natureza religiosa? O texto que acompanha as figuras não explica nada a esse respeito...
Para demonstrar como é proposto o exercício de análise em sua cartilha, Dordal apresenta, então, mais uma lição.



                                      

                                       

                                           Figura 1.2
               Lição da Cartilha Moderna de Ramon Roca Dordal
            Fonte: Revista de Ensino, edição de 1902, ano I, nº 2.

Nessa lição, os alunos também devem olhar as figuras apresentadas e ler as palavras que estão localizadas abaixo das mesmas. Depois, as palavras colocadas nas três colunas. Segundo o autor, a utilização da escrita do tipo chamado “redondo” e do tipo chamado “de mão” facilita a leitura das frases que encerram a lição desta página. Por fim, o professor deve utilizar as palavras da coluna central para junto com seus alunos formar novas frases, as quais são escritas no quadro-negro e copiadas pelos alunos.  Finalmente, Dordal apresenta a lição da página 24 de sua cartilha.
                                          Figura 1.3
               Lição da Cartilha Moderna de Ramon Roca Dordal
      Fonte: Revista de Ensino, edição de junho de 1992, ano I, nº 2.
Nessa lição, o autor apresenta a primeira historieta, acreditando que é a partir dela que seu aluno toma a consciência de que já sabe ler:

É a primeira pagina que sem saltos, sem abandonar o caminho encetado, sem sacrificar o methodo, apresento a primeira gravura ao lado, desejando convencer o alumno de que elle sabe lêr uma pequena historia. Ahi, apesar de não dispor ainda de todas as lettras do alphabeto, permitta-se-me a immodestia, a historieta apresentada, e em face da gravura, não é inferior ás contidas em qualquer livro de leitura. Consegui o meu objectivo, o pequeno estudante acredita que já sabe lêr. (...) Attingi assim um fim importante; tornei o ensino agradavel sem sacrificar o methodo (Dordal, 1902, p.225).

 Na conclusão, Dordal convida os seus colegas “progressistas” a fazerem as críticas e manifestarem suas opiniões a respeito de sua exposição.
E ainda nesta mesma edição, com o artigo A seriação dos livros de leitura, Joaquim Brito volta a manifestar-se sobre a Cartilha Moderna de Roca Dordal, indicando-a como livro adequado às dificuldades do aluno e ao seu nível de compreensão. Brito argumenta que

Quanta vez nos sentimos contristados, vendo em algumas escolas, alumnos de 1º anno e de 2º, principalmente, lendo livros cujo assunpto esta acima do seu desenvolvimento intellectual, e então nos vem immediatamente a idéa de uma pessoa que traduz mal uma lingua qualquer e a quem damos a ler uma obra prima de litteratura. Apesar do esforço empregado para descobrir as belezas nella encerrada, após dez minutos de leitura, este livro, para uns um verdadeiro primor de arte, um verdadeiro encanto, torna-se para ella enfadonho. Obriguem-n’a a ler mais dez minutos, e esse livro será um verdadeiro instrumento de supplicio. É o que acontece com as nossas creanças! Dão-lhes livros cuja leitura está acima de sua comprehensão, e em que, em cada pagina apenas apanham alguma phrases (Brito, 1902, p.180).

Com a defesa do método analítico da palavração contido na Cartilha Moderna, apresentada nos artigos de Brito e Dordal, deflagra-se o debate.
A edição de outubro de 1902, ano I, nº4 , também ocupa-se com a pertinência do método analítico da palavração, apresentando, primeiramente o artigo de Luiz Cardoso, Arte de Leitura e a Critica. Neste, o autor apresenta as vantagens de sua Cartilha Arte de Leitura . Baseada no trabalho de João de Deus[3], Cardoso afirma:

A ‘Arte de Leitura’ como todas as nossas concepções, tem passado por tres phases características, a saber: primitiva, transitoria e definitiva, correspondendo perfeitamente, cada uma dellas, ás phases porque tem passado a humanidade.
A primeira é a soletração, em que se reunem nomes absurdos de letras, exigindo-se valores, geralmente, não envolvidos nas respectivas denominações; a segunda é a sylabação, em que se formam sylabas, sem significação alguma, com o fim de mais tarde, reunil-as em vocabulos; a terceira, finalmente, é a palavração, em que se inicia o ensino pela leitura de palavras animadas-isoladas e reunidas em sentenças e historietas (...)
Assim pois, segundo a lei da evolução humana, devemos partir da palavra para chegarmos ás narrações, empregando em primeiro logar, não a linguagem literária, mas a vulgar; familiar ao aluno (Cardoso, 1902, p.770).


Com seu artigo, Cardoso compara a evolução dos métodos de ensino à evolução por que tem passado a humanidade. O autor as denomina de primitiva, transitória e definitiva, e as relaciona com o ensino da leitura e escrita que também é considerado pelo autor, composto por três fases: soletração, silabação e palavração. Provavelmente, quando o autor menciona as fases pelas quais tem passado a humanidade, está referindo-se a Lei dos três estados desenvolvida por Auguste Comte: teológico, metafísico, positivo, dada a influência do positivismo na busca pela cientificidade do conhecimento, bem como a necessidade de justificar cientificamente a proposição de que o ensino da leitura e escrita deve ser iniciado pelo método analítico de palavração.  O teológico corresponde ao estado primitivo, que o autor relaciona ao ensino pela soletração, o metafísico ao transitório e por sua vez pode ser relacionado ao ensino pela silabação e finalmente o estado positivo, definitivo, científico que pode ser relacionado ao ensino pela palavração.
Posteriormente ao artigo de Cardoso, esta mesma edição publica o artigo Ensino da Leitura (Carta aos Professores J. de Brito e R. Roca Dordal) assinado por João Kopke. Neste, o autor responde aos colegas, partindo dos próprios argumentos utilizados por eles: de que seu método é inaplicável nas escolas por ser o ensino coletivo e porque nem todos os professores sabem desenhar.

A confutação que trago a este fundamento de rejeição é tão simples quanto decisiva: eu nunca fiz do conhecimento do desenho pelo professor uma condição para o uso do processo. Abram os meus caros collegas a minha conferencia e, à pagina 18, ahi lerão: Cada mestre - e este é o ideal - póde, com os elementos do meio, compor, á vista da classe, a sua historia. (...) Á apresentação do conto, porém, deve preceder a de um esboço, que fale por si. E dito isto (...) foi que apresentei o desenho illustrativo do conto (...) feito pelo professor de trabalho manual da Escola Caetano de Campos (...). Eu não desenhei, (...) não exigi como condição que o professor desenhasse - sim, porém, que, si possivel (...) o professor, com as palavras do meio, isto é, o vocabulario dos alumnos, compuzesse, á vista da classe, um conto, uma historia, adaptada a um esboço, que falasse por si, decifrando ás crianças, pelo desenho, aquillo que os phonemas lhes devem decifrar na linguagem graphica (...). Concordareis, em vista da prova exhibida, que não sendo condição necessária para o emprego do processo, que o professor desenhe, mas que apresente um desenho illustrativo do conto ou texto a ler, a vossa objecção cai por terra  (Kopke, 1902, pp.773 e 774).

Mais adiante, Kopke pergunta:

Si eu apresento um desenho a um individuo isolado, e á vista desse desenho, em palestra, alegremente, vou animando o individuo até que elle consiga conhecer, explicar, lêr e reproduzir os caracteres graphicos, que compõem as sentenças que puderam ser formuladas a respeito do mesmo desenho, e, logo, compor, com o proprio individuo, a historieta que o desenho inspirar - não seria possivel, seguindo o mesmo processo, conseguir de muitos individuos juntos o que, com certeza, se consegue de um só? (...) Para mim, si methodo é, como ensina a etymologia,  “caminho em direção a”, o methodo, que for efficiente para a instrucção do individuo, também o ha de ser para a instrucção da collectividade, salva a differença de serem as vantagens proporcionaes á efficacia do instrumento ou processo empregado para a conformidade com o mesmo methodo. Ora, no ensino da leitura, qualquer que seja o methodo adoptado, o instrumento é, de dous, um: o livro ou o quadro negro(...). Dizer que o livro, por sua propria natureza, é mais profícuo para o ensino individual, e o quadro para o collectivo, comprehende-se, porque, (...) deante do quadro, séde da acção do mestre, a attenção e a assimilação de cada individuo, convergindo para o centro commum, asseguram a attenção da collectividade. (...) Assim sendo, o methodo analytico tanto é aplicável ao ensino da leitura ao individuo com á classe, e si o quadro é instrumento de mais efficacia para o ensino de classe do que o livro, onde está a razão da inapplicabilidade do processo, que adopto e preconizei, e que ambos ‘vós reputaes o melhor para a instrucção individual’? (Kopke, 1902, pp.775 e 776)

Com este artigo, Kopke desmonta os argumentos dos colegas que reprovam o seu entendimento sobre o método analítico de palavração. Se é possível aplicar o método de Kopke para classes compostas de vários alunos, bem como se é desnecessário que o professor saiba desenhar, as dificuldades apontadas por Brito e Dordal estão resolvidas.
Kopke propõe, então, que seja apresentada aos alunos a mesma figura da Cartilha Moderna, em tamanho grande e com  perguntas dirigidas a eles, compõe a seguinte história:


                                  



                                          Figura 1.4
    Lição proposta por João Kopke a partir de uma ilustração da
               Cartilha Moderna de Ramon Roca Dordal
 Fonte: Revista de Ensino, edição de outubro de 1902, ano I, nº 4.




                                      Figura 1.5
 Lição proposta por João Kopke a partir de uma ilustração da
                Cartilha Moderna de Ramon Roca Dordal
   Fonte: revista de Ensino, edição de outubro de 1902, anoI, nº 4.

Reparem que Kopke é explicito ao tratar da figura que apresenta um menino nascendo do ovo. O que pretende ao mostrar um menino nascendo de um ovo? Ele também adere a uma forma velada, moralmente aceitável para a época, de explicar de onde nascem as crianças?
Depois do texto construído, deve ser feita a análise das sentenças e das palavras. Ao professor, conforme o autor,  cabe:

1º apontar e dizer as palavras do exercicio, como a mãi aponta ao filhinho as pessoas da familia e lhe diz papai, titia, vóvó, etc., sem ter ouvido préviamente cada som componente de per si, e repita o todo ouvido;
2º mostrar cada palavra de per si e exigir que o alumno lhe indique as eguaes;
3º agrupar as palavras de modo que as analogias e contrastes entre ellas se destaquem bem, harmonizando a impressão visual com a acustica;
4º proferir as palavras e pedir ao alumno que aponte as escriptas correspondentes;
5º indicar as palavras para que o alumno as profira;
6º fazer proferir as palavras com emissão lenta, discriminando as sylabas que em tom de tinta póde distinguir aos olhos; e
7º finalmente, fazer destacar na sylaba pela emissão lenta, os phonemas, cujo valor assim entrará na posse do aprendiz,  por trabalho de acquisição de sua potencia intellectiva, exercida pelo modo mais completo e proficuo.
Está claro que esta gradação será feita sobre exercicios organizados: 1º com um vocabulario al alcance do alumno; 2º sobre idéas que lhe sejam familiares e sympaticas; e 3º com o auxilio de estampas, que concretizem taes idéas e exerçam a sua inducção com o maximo de intensidade (Kopke, 1902, pp.790 e 791).

Os artigos de Roca Dordal, Brito, Cardoso e Kopke indicam não só um debate sobre qual método e qual cartilha são os mais adequados para o ensino da leitura e escrita, como também entendimentos diferençados a respeito dos métodos de ensino da leitura e escrita. Cardoso propõe que o ensino da leitura e escrita deve ser ministrado através de  palavras que, em verdade, são letras que podem adquirir sentido, por exemplo as interjeições. Assim, o método proposto por Cardoso é o sintético pela soletração. O autor, em artigos posteriores, apresenta mais detalhes que esclarecem a aplicação de seu método. Dordal e Brito apresentam um método analítico da palavração baseado nos procedimentos do método sintético pela silabação. O texto da Cartilha Moderna revela uma preocupação em manter a tradição da silabação. Ainda que para esses autores devam ser apresentadas palavras no início do processo do ensino da leitura, essas palavras são vocábulos monossílabos ou no máximo dissílabos, que, na sua composição fonética, privilegiam a análise das sílabas. O método analítico da palavração apresentado por Kopke  diferencia-se na medida em que, além de iniciar o processo de ensino pela elaboração coletiva do texto, privilegia a análise das palavras que, por sua vez, são escolhidas não mais com a preocupação em manter o enfoque no ensino das sílabas mas sim, em apresentar, por meio de gravuras e palavras correspondentes, idéias familiares que devem favorecer a aprendizagem da leitura e da escrita.
Observa-se, então, que o eixo da divergência não encontra-se no fato de ser o método analítico da palavração inaplicável às classes onde o ensino é coletivo, nem tão pouco na falta de habilidade de desenhar de alguns professores. Encontra-se sim, no entendimento diferençado que têm os autores a respeito do método analítico pela palavração. Para Cardoso a palavra escolhida, para o ensino da leitura e escrita, deve ser a letra, (menor parte da palavra) imbuída de sentido para o alcance da mente infantil (por exemplo, as interjeições); para Dordal e Brito, as palavras escolhidas devem ser monossílabos e dissílabos que privilegiem a análise das sílabas; para Kopke, a escolha das palavras deve considerar a composição das frases e sentenças bem como o desenvolvimento da mente infantil, independente do aspecto fonético.
No nº5 da Revista de Ensino de dezembro de 1902, Arnaldo Oliveira Barreto em seu artigo Ensino da Leitura apresenta-se com a intenção de conciliar os pontos de vista divergentes, apresentados por Brito, Dordal, Cardoso e Kopke. Barreto defende que as partes devem ceder.

De modo geral  o que tem até hoje mantido o desacordo, isolando os elementos favoráveis ao almejado fim, é justamente esse de cada um não querer ceder o que de menos existe no carrancismo do methodo synthetico, e o que de mais persiste no methodo analytico, considerado, está  visto, em relação à lingua portugueza.
No meio termo, a nosso ver, é que está a verdade; isto é, si uns concederem iniciar-se o primeiro ensino da leitura pelas sentenças, auxiliando-se esse inicio com estampas e suggestivas; e outros admittirem que em cada lição haja um phonema que lhe seja a base, ou por assim dizer, o seu pivot, (...) e que, em subsequentes lições se decomponham as sentenças em palavras e estas em seus elementos como o exige a natureza de nossa língua materna - para nós, repetimos, o problema naturalmente se resolve (Barreto, 1902, p.962).

Barreto propõe um acordo que não pode ser aceito por Brito, Dordal e Cardoso - iniciar o ensino da leitura e da escrita pela sentença -, pois é tudo o que rejeitam. Em verdade, o acordo proposto por Barreto sugere que Brito, Dordal e Cardoso aceitem o entendimento que Kopke tem do método analítico de palavração. Indiscutivelmente, Kopke privilegia a palavra, não a sentença, porém, a palavra é destacada da sentença que deve fazer sentido para o aluno.
Apesar da iniciativa de Barreto, a divergência  permanece. Luiz Cardoso nesta mesma edição, em seu artigo Arte da Leitura e a Crítica volta a defender, com mais detalhes, o método analítico da palavração, utilizado em sua cartilha Arte de leitura. Para Cardoso, depois de educar os principiantes a ouvirem com desembaraço os sons da fala, o

... ensino da leitura elementar consiste na anályse empírica dos elementos dos vocábulos oraes (...): vá, uva, aza, já, vejo, fava, ceva, roxo, mesa, bife, pé, dedo, tatu, lata, etc. (...) O verdadeiro ponto de partida no ensino da leitura propriamente dicta, consiste em considerar as formas graphicas das palavras como symbolos de idéas. Subsequentemente então se analysará o vocábulo decompondo em sylabas e estas em seus elementos fundamentaes oraes e graphicos; exercícios estes que concorrem, poderosamente, não só para enriquecer e consolidar o cabedal adquirido, como para despertar no alumno a disposição de contar comsigo mesmo no estudo de novas lições, pelo conhecimento empirico de regras que concorrerão sobremodo para a boa ortographia, em futuro não distante  (Cardoso, 1902, p.976).

Em contrapartida, Kopke com o artigo Ensino da Leitura de fevereiro de 1903, ano I, nº6, volta a explicar como deve ser aplicado o método analítico da palavração adequado ao ensino da leitura e da escrita. Para ele, não pode ser ignorado que, mesmo sendo hoje o alfabeto apenas um código de sinais, outrora estes sinais foram representação abreviada, mais ou menos elaborada de um objeto material. Partindo da idéia da ligação entre o sinal e seu  significado, conclui que todo sinal deve corresponder e significar uma coisa e só uma coisa, bem como, cada coisa deve ser representada por um só sinal. Sendo assim, Kopke afirma que as crianças esperam que os sinais impressos sigam estas condições. Se o ensino da leitura e da escrita privilegia, no primeiro momento, o ensino dos diferentes sons de cada símbolo gráfico ou o ensino dos símbolos diferentes que correspondem ao mesmo som, pode confundir as mentes infantis.
Kopke desenvolve forte argumentação contra o ensino pelo método sintético da soletração e silabação. Se concordarmos com a afirmação de Kopke, de que o processo percorrido pela humanidade para construir um código escrito corresponde ao processo de aprendizagem do mesmo; se concordarmos com a idéia de que quando uma criança está aprendendo um código escrito, também entende que os sinais escritos correspondem a um só som e significado, parece fazer sentido a idéia de que começar o ensino deste código de sinais pelas suas diferentes aplicações pode confundir o aprendiz.
No artigo, Kopke expõe as fases adequadas para o ensino da leitura e da escrita:

1ª) Apresentação das palavras no quadro negro pelo mestre.
2ª) Reconhecimento dessas palavras em ordem variada pelos discipulos.
3ª) Contribuição dos discipulos.
4ª) Reconhecimento das palavras já apresentadas e dispostas em mapas.
5ª) Reprodução dos discipulos no Compenedor[4]
6ª) Reconhecimento das palavras e sentenças já aprendidas na cartilha.
7ª)Exercicio no quadro-negro por meio da comparação e contraste (Kopke, 1903, p.1187).

O autor também reafirma que apresentar o desenho do objeto acompanhado por palavras é muito importante. O reconhecimento dessas palavras consiste em três diferentes operações: “1ª) Acha-me; 2ª) Faze-me; 3ª) Que palavra é esta?” (Kopke, 1903, p.1189). Para reconhecer as palavras dispostas em mapas, os alunos devem, sob orientação do professor,

ler para diante, ler para traz, indicar palavras, proferir as palavras indicadas, descer, subir, saltear - tudo isto empregando afim de impedir o tédio da classe. E. si isto se cumprir fielmente, um outro principio educativo evoluirá na consciência do mestre: o bom ensino consiste na repetição, que é infinita, mas nunca monotona (Kopke, 1903, p.1191).

Para o trabalho com o livro,

As creanças, pois, lerão as primeiras paginas do livro com grande facilidade. Lerão, e esse é o ponto capital. Um dos objectivos principaes no espirito de todo bom mestre é crear no espirito de seus discipulos a consciência, mais do que isso, a sensação do poder. O insuccesso, a confusão, o atordoamento não levam nenhures; não dão resultado. Pondo as creanças em boa disposição de espirito, tornais-as amigas do que estão fazendo, e a batalha estará ganha. Seu progresso, depois disso, será um perpetuo prazer. (Kopke,1903,p.1193)


Continuando o debate, Luiz Cardoso, na edição de fevereiro de 1904, ano II, nº6, retorna com o artigo Arte de Leitura e a Critica, prestando maiores explicações a respeito do método aplicado em sua cartilha Arte de Leitura. Apresentando mais detalhes, o autor afirma, que o ensino da leitura deve ser constituído por cinco fases. A primeira, aproveita as interjeições emitidas pelas crianças:

... Á - (...) emitida pela creança mal educada, quando reprehendida pela sua carinhosa mãe. (...)
é - “O Ivo é viuvo?
É”. A resposta como vemos, nada mais é sinão a segunda voz nominal.
I- Quando uma creança vê alguma cousa que lhe agrada, expontaneamente, emitte a interjeição “ih...” que dá perfeita idéa da voz caracterizada na escrita pela vogal i.
Ó - Quando o vento tira o chapéo a um individuo ou quando dois amigos se encontram, ouvem-se quasi sempre a interjeição “oh!”, lembrando o valor nominal da vogal o.
U- A interjeição “uh!” empregada pelas creanças para assustarem os seus colleguinhas, nos mostra o valor da vogal u (Cardoso, 1904, pp.1200 e 1201).

O autor orienta também para que todas as letras do alfabeto sejam trabalhadas a partir de ligações entre valores sonoros e significações ao alcance da compreensão dos alunos.
A segunda fase deve privilegiar a análise de seus elementos orais, uma vez apresentados os vocábulos: ave, ovo, uva, vôa, véu etc.
A terceira fase deve apresentar aos alunos a forma gráfica de cada letra:  “... o retrato da palavra A será descoberto pela sua parecença com uma avezinha; da É, com um gancho de sobrecarga; da I, com uma bengala, da O, com uma roda e da U, finalmente com uma ferradura...” (Cardoso, 1904, p.1205).
A quarta fase deve ensinar o aluno a decompor as referidas palavras em seus elementos gráficos. E por fim a quinta fase, em que conhecido “...um certo numero de palavras, que representem- objetos, qualidades, actos, etc:-, encaminhe-se os alumnos a ler phrases, sentenças e mesmo historietas ao alcance de suas intelligencias...” (Cardoso, 1904, p.1208).
Para elogiar o método apresentado por Luiz Cardoso em sua cartilha Arte de Leitura,  a edição de abril de 1904, ano III, nº1, apresenta o artigo de O. Carvalho, também intitulado Arte de Leitura. Segundo o autor, Cardoso é muito feliz na confecção das lições de sua cartilha.

Da 5ª á 13ª lição tratastes de palavras formadas de vozes e articulações proferíveis vvv, ff, jjj. Esta classificação obedece, naturalmente, á facilidade encontrada pelo professor em explicar ao principiante o valor phonico dessas articulações e á facilidade com que os alumnos as assimilam  (Carvalho, 1904, p.59).


Contudo, na edição de junho de 1904, ano III, nº2, retorna João Kopke, agora para discutir a respeito de Livros Escolares, título de seu artigo. A pedido de R. Puiggari e A. Barreto,  Kopke apresenta sua opinião sobre a série Livros de Leitura de autoria de  Puiggari e Barreto. Além disso, apresenta um conceito de leitura, no qual fundamenta a sua cítica.

Si ler é pensar, o discurso e a palavra são a realidade para o que aprende, e do discurso e da palavra - não da sylaba, nem da letra, se há de subir á arte da leitura; si ler é provocar o desenvolvimento da expressão - é da emoção congenial ao espirito e do interesse, que acorda a vontade, que se há de esperar a leitura proveitosa; não da mecanica inconsciente, não da consciência agilitada num manejo sem utilidade.
Foi sob a inspiração deste critério, que comprehendestes a vossa série?
A resposta a tal interrogação, devo eu procural-a na vossa obra didactica. (...) Preciso subir á Cartilha das Mães de Arnaldo Barreto e ao livro de Galhardo, modificado por Puiggari, para dizer da collecção “Puiggari - Barreto”  (Kopke, 1904, p.203).

O conceito de leitura apresentado por Kopke dá sustentação à escolha do procedimento metodológico a cerca do ensino da leitura e escrita: entendendo que ler é pensar e provocar o desenvolvimento da expressão, o autor propõe que o método privilegie o ensino da leitura e escrita com compreensão do significado das palavras que estão sendo ensinadas. 
Assim, utilizando a Cartilha das Mães[5] e a Cartilha da Infância[6], manifesta sua opinião a respeito da série Livros de Leitura.

A Cartilha das Mães tem ainda a censura umbilical, que a filia aos processos do passado, ligando phonetica e palavração, em vez de fazer da idéa, do pensamento, o grande eixo, como requer, pratica e aconselha a pedagogia do seculo. A Cartilha da Infância é, francamente, o méthodo sylabico, cujos resultados admiraveis, o seu auctor, no prefacio, attesta e exalta, preferindo-o.
É pois, sob a influência dos principios, que ainda lhes não deixaram emancipado o espirito para se convencerem de que “todos os methodos e processos, que emmaranham a attenção do aprendiz em formas verbaes e analyses de palavras, são outras tantas obstrucções ao desenvolvimento do poder mental, e não ajudam economicamente a pensar por meio das palavras impressas” - é sob essa influência que tenho de apreciar os auctores da série “Puiggari-Barreto”  (Kopke, 1904, p.203).

A crítica que Kopke empreende à série Livros de Leitura de autoria de Puiggari e Barreto é constituída de argumentos que servem também aos defensores do método sintético pela soletração, caso de Cardoso, e pela silabação, caso de Dordal e Brito. Kopke aproveita a oportunidade para afirmar que o ensino da leitura e escrita não pode ser iniciado pela letra, nem pela sílaba, pois a leitura deve ser ensinada proporcionando ao aprendiz o entendimento daquilo que está aprendendo.
A consulta à legislação de ensino vigente neste período, em que a Revista de Ensino registra o debate sobre métodos de ensino da leitura e escrita, indica que os defensores dos diferentes métodos - analítico pela sentenciação, analítico pela palavração, sintético pela soletração, sintético pela silabação - estão disputando a legalização das suas propostas, exatamente porque a escola pública e os seus padrões de ensino estão em pleno processo de reforma.
O cotejo entre as informações fornecidas pela Revista sobre o debate entre aqueles métodos e as fornecidas pelas determinações legais dos programas de ensino permite que se verifique o impacto, sobre essas determinações legais, dos argumentos utilizados na defesa dos diferentes métodos de ensino de leitura e escrita.
Com o Decreto nº248, de 26 de julho de 1894, estabelece-se que as matérias e o programa de ensino das Escolas Preliminares[7], devem ser, no 1º ano[8]:
                                                            Quadro 1.2
 Programa de Ensino das Escolas Preliminares - Decreto nº248 - 26/07/1894


1ª Série
 Leitura

Escrita
- cópia de palavras da lição da leitura, letras do alfabeto e algarismos arábicos Orientou ainda que estes exercícios deveriam ser feitos no quadro-negro pelo professor e copiados pelo aluno

  Série
Leitura
1º livro de leitura, soletração, palavras
de formação regular dadas no quadro-negro ou livro, exercícios orais, sentenças sobre coisas que usam, que vestem, que comem etc.
Escrita
letras do alfabeto, pequenas sentenças copiadas do quadro-negro (??)
Educação Moral e Cívica
Hábitos de ordem, comportamento na escola, em casa, na rua e em lugares públicos, deveres para com os pais e superiores, iguais e inferiores, tratamento adequado aos animais, máximas que desenvolvam boas qualidades, nomes das principais autoridades do lugar, do estado e do país, leitura de palavras que despertem idéias nacionais tais como: cidadão, soldado, exército.

   Fonte:  Elaborado com base nos programas de ensino incluídos na Coleção das   Leis e Decretos do Estado de São Paulo - 1889-1920.

Porém, com o Decreto nº1217 de 29 de abril de 1904, o programa de ensino de leitura e escrita, ministrado nos Grupos Escolares[9] e Escolas-Modelo[10] sofre significativas alterações. Para o 1º ano, Grupos Escolares e Escolas-Modelo devem ministrar  as seguintes matérias e obedecer o seguinte programa de ensino da leitura e escrita:



Quadro1.3
 Programa de Ensino dos Grupos Escolares e Escolas-Modelo
Decreto nº1217 - 29/04/1904

Leitura
Processos:
Quer seja empregado o processo de silabação, quer seja o de palavração, o professor esforçar-se-á para obter dos alunos a maior expressão e naturalidade na leitura, assim como o conhecimento do trecho lido. Fará também explicação sobre o sentido real ou figurado das palavras encontradas no livro de leitura. Nenhuma palavra poderá ser ensinada sem que a criança  tenha idéia clara sua significação.
Programa:
palavras e o que elas representam, sons e letras, sentenças formadas de palavras familiares, conexão com a pronúncia, livro apropriado à idade e ao desenvolvimento do aluno, sinais de pontuação.
Lições auxiliares:
cópia de pequenas sentenças do livro de leitura, formação de palavras com cartões de letras.
Linguagem
Processos:
Despertar a atenção da classe para fatos instrutivos e morais. Corrigir os defeitos da pronuncia e os vícios de linguagem.
Programa:
Palestras sobre diversas disciplinas para o desenvolvimento da linguagem , sentenças sobre coisas que as crianças usam, vestem, comem, nomes de animais e coisas.
Lições auxiliares:
Cópias de nomes de animais e coisas.
Caligrafia
Processos:
Os exercícios de caligrafia acompanham as lições de leitura, assim os alunos começarão desde o primeiro dia de aula, a copiar letras, palavras e pequenas sentenças. Ao professor incumbe corrigir a posição dos dedos e do corpo. No primeiro ano, os exercícios serão feitos no primeiro semestre nas ardósias e no segundo semestre serão feitos no papel com lápis. Do segundo ano em diante serão usados os cadernos e letra norte-americana, completando este ano com o ensino da letra de fantasia.
Programa:
Cópia de letras, palavras, algarismos arábicos e romanos e pequenas sentenças do livro de leitura, ou escritas no quadro negro pelo professor.
Lições auxiliares:
Exercícios rápidos, dirigidos pelo professor, tendentes a obrigar o aluno a escrever letras e palavras sem levantar o lápis ou pena do papel. Cópia de lições do livro de leitura.
Instrução Cívica e Moral
Processos:
A instrução moral é ensinada principalmente pelo exemplo. A disciplina deve ser um grande auxiliar. A vida escolar deve ser o seu principal assunto.
Programa:
Não figura dos horários. Constitui o assunto de lições de linguagem: trechos morais, trechos cívicos, adágios populares, pequenas poesias, historietas.

Fonte: Elaborado com base no Decreto nº1217/1904, publicado na Coleção das Leis e Decretos do Estado de São Paulo - 1889-1920.

Verifica-se que assim como o Decreto nº248 de 1894, o Decreto nº1217 de 1904 estabelece a instrução cívica e moral. A educação moral e patriótica deve estar agregada ao ensino de leitura e escrita, sendo tema de textos e palavras ensinadas no ensino preliminar. Lições sobre hábitos de ordem, comportamento na escola, em casa, na rua e em lugares públicos, deveres para com os pais, tratamento adequado aos animais, leitura de palavras que despertem idéias nacionais tais como: cidadão, soldado, exército devem compor o quadro de lições responsáveis em formar o cidadão republicano.
Além disso, os programas apresentam uma preocupação com os processos a serem seguidos no ensino de leitura e escrita. Sugerindo lições com cópia de palavras e sentenças juntamente com soletração e cópia de letras do alfabeto, conforme o Decreto nº248, de 1894, ou ainda, deixando para livre escolha do professor os métodos de silabação ou de palavração, conforme o Decreto nº1217, de 1904, os programas oficiais apresentam uma ambigüidade na determinação de qual deve ser o procedimento de ensino a ser seguido.
De um lado é possível afirmar que os Decretos determinam a utilização do método de palavração, porque, ainda que o ensino das letras conste também no quadro de lições, o programa de ensino determinado pelo Decreto nº248 estabelece que palavras e sentenças devem ser ensinadas juntamente com a soletração e a cópia do alfabeto. Desta forma, é possível entender que a soletração e a cópia de letras deve corresponder às palavras destacadas da sentença ensinada, o que significa que o ensino de leitura e escrita pode ser, neste caso, iniciado pela palavração.
O Decreto nº1217, pode ser interpretado da mesma forma. Mesmo estabelecendo que no programa de leitura e escrita deva constar também o ensino das letras, o Decreto determina que, inicialmente, ao aluno deve ser oferecido o conhecimento do sentido real das palavras a aprender. Primeiro, o conhecimento do objeto, depois a escrita do nome do objeto conhecido. O ensino das sílabas e letras é decorrente do ensino da palavra. Assim, pode-se entender que o Decreto nº1217 reafirma a preferência pelo método de palavração quando do ensino de leitura e escrita. O método de silabação pode, neste caso, ser descartado uma vez que, se o ensino da leitura é iniciado pelo ensino de letras ou sílabas, o conhecimento sobre os objetos não é necessário, mesmo porque, letras ou sílabas isoladas não podem representar objetos.
Por outro lado, é possível admitir que, de acordo com essas determinações, o ensino pode ser iniciado pelo método de silabação ou até de soletração. Nada impede o professor de iniciar o ensino de leitura e escrita pela letra ou sílaba e posteriormente apresentar figuras e discutir seu significado com os alunos, ainda que para os defensores do método de palavração, essa forma de ministrar o ensino, seja fragmentada e absurda.
Ao que parece, defensores do velho método de silabação e soletração e do novo método de palavração e sentenciação disputam um lugar nos programas determinados pelos Decretos, já que as duas orientações são incompatíveis, sem terem conseguido, até aquele momento, a primazia dos seus pontos de vista.
Cinco anos e dezessete publicações depois, a Revista de Ensino publica em seqüência uma série de quatro artigos em defesa do método analítico. A edição de março de 1909, ano VIII, nº1, volta ao assunto com Theodoro de Moraes assinando o artigo Leitura Analítica. Neste, o autor retoma a argumentação contra o método sintético pela silabação e soletração. Para ele, a silabação e a soletração

desfiguram os effeitos educativos, mutilam a alma do ensino que toda se concentra no entendimento do que se aprende. Estabelecem, de golpe, esses dois methodos, uma brusca solução de continuidade no desenvolvimento espontaneo da linguagem da criança, cuja intelligencia se desarvora em meio daquelle mundo exotico de letras e sylabas, para transformar-se, ella, por si mesma tão activa e vibratil, num receptaculo dos elementos inertes e inexpressivos da palavra. O alumno, assim conduzido, annula-se; reduz-se á apagada e raza posição de repetidor gaguejante de uma cambulhada de miudezas abstractas que o estonteiam e, atrophiando-lhe o espirito, deixam sempre nelle impresso um invencível desgôsto pela leitura, sinão - muitas vezes- o sello do idiotismo (Moraes, 1909, p.18).

Com o artigo de Moraes, inicia-se a organização de um verdadeiro conjunto de argumentos contrários aos métodos sintéticos da soletração e silabação. De repetidor gaguejante à receptáculo de elementos inertes e inexpressivos da palavra, o autor não polpa exemplos a respeito dos maus resultados decorrentes de um ensino de leitura e escrita ministrado pelos métodos de silabação e soletração.
A edição de junho de 1909, ano VIII, nº2, apresenta o artigo O Methodo Analytico assinado por J. Carneiro da Silva. Neste, o autor ocupa-se em apresentar como deve ser aplicado o método analítico, com base nas determinações do Diretor Geral da Instrução Pública, Oscar Thompson[11]. Segundo o autor, por meio de perguntas                                                                                                                                                                                                                                                                claramente formuladas e com auxílio de gravuras ou objetos, o professor deve conduzir a                                                                                                                                                                                       classe a formular respostas em sentenças, que são escritas e trabalhadas intensamente no quadro-negro e que por sua vez, devem coincidir com as lições da cartilha, a ser introduzida posteriormente. Somente depois que as crianças conhecem com segurança as sentenças trabalhadas no quadro-negro e na cartilha, é feita a análise em vocábulos. Esta análise não deve ultrapassar o vocábulo, chegando à sílaba ou letra; pelo menos, não nessa etapa.
Na edição de setembro de 1911, ano X, nº2, Carlos Escobar assina A leitura analytica. Neste, o autor procura explicar os princípios biológicos e psicológicos do método analítico. Escobar, baseando-se na estrutura cerebral humana e na história do desenvolvimento intelectual,  afirma que o processo de análise precede o processo de síntese. Justifica assim, a inadequação do ensino de leitura e escrita iniciado pelo método da silabação ou soletração,  afirmando  que o método mais adequado a natureza intelectual humana é o método analítico, pois este inicia o processo de ensino, pela análise que por sua vez deve ser complementada pela síntese.

A leitura analytica tem os seus fanaticos. Esses fanaticos apregoam que se apprende a ler, lendo-se só sentenças. A sentença não ensina a ler, é um meio para se apprender a ler. Quando a criança destaca os termos da sentença, que ella sabe ler como um todo, depois destaca as syllabas das palavras conhecidas, e por fim destaca as lettras, quando ella chega ao phonema, por uma analyse mental, intelligente, a criança inverte naturalmente a marcha, e começa a ajuntar lettras, para formar syllabas, syllabas para formar palavras, palavras para formar sentenças. Então só assim ella apprende a ler.
Em primeiro logar, a analyse; em segundo, a synthese: tal é o methodo completo. Pela analyse, a criança desce da sentença ao phonema; pela synthese, ella sóbe do phonema á sentença.
Assim, a criança segue a marcha que seguiu a especie, analysando para synthetizar, conforme a nossa estructura nervosa  (Escobar, 1911, p.12).


O autor também procura convencer os defensores do método sintético, à idéia de que no processo analítico estão contempladas a silabação e a soletração.


A leitura analytica não póde ser o ponto da discordia na escola primaria. O methodo analytico, como exprime o seu principal attributo, contem a palavração, a sylabação e a phonação.
O principio da sucessão dos estados de consciencia ensina a criança a destacar os termos da sentença: ella propria apprende a ler palavras, satisfazendo os admiradores da cartilha João de Deus.(...) ensina a criança a sylabar, satisfazendo os partidarios da sylabação. (...) ensina a criança a destacar as lettras, satisfazendo os phonetistas (Escobar, 1911, p.14).

Escobar refere-se também às orientações de Oscar Thompson segundo as quais, a “processuação” do método deve ser de escolha individual, bastando apenas ao professor respeitar a marcha descendente e ascendente, analítica e sintética do ensino.
A edição de setembro de 1911, ano X, nº2, encerra a série de artigos com L. Charenton assinando De como desenvolver nas crianças o gosto pela leitura. Mesmo que o artigo não se refira diretamente à defesa da aplicação do método analítico, afirma a importância do estudo das palavras, remetendo-se assim ao método analítico pela palavração. Na opinião do autor, os alunos abandonam a leitura por vários motivos:

  Não sabem ler, que dizer, comprehender e sentir tudo quanto em uma obra está ao seu alcance. O pensamento do auctor escapa-lhes.(...)
É necessário, portanto, que ensinemos aos nossos alumnos a arte de ler com proveito, que os induzamos a comprehender, a reflectir, ajuizar, observar e sentir. Alcançaremos este fim por meio de exercícios de leitura explicada, bem escolhidos: estudo das palavras, commentário e analyse das idéas, exames das qualidades do estylo.
2º O emprego de livros faz-se de improviso: (...) dá-se-lhes o 1º volume que nos vem a mão. É preciso pelo contrario, escolher o livro tendo em conta a edade, o caracter, o gosto, a intelligencia, as aptidões da creança e mais ainda o meio em que ella vive.
3º A leitura individual não é fiscalizada nem fomentada.(...)
Exigir-se-ha do discipulo um resumo, seja da obra inteira, seja de um capitulo, seja somente de duas ou tres paginas;(...)
É necessário, finalmente, que o mestre se esforce em inspirar o desejo e o gosto pela leitura (Charenton, 1911, pp.47 e 48).

Nesta seqüência de artigos, evidencia-se uma investida contra o ensino da leitura e escrita iniciado pelo método sintético da soletração e silabação, bem como a reafirmação da superioridade do método analítico. Se, até a edição de  junho de 1904, ano III, nº2,  a Revista de Ensino ainda publicava artigos favoráveis ao método sintético de soletração e silabação, o debate entre os métodos, depois da publicação desta seqüência de artigos, desaparece das páginas da Revista de Ensino, que deixa de publicar artigos favoráveis ao método sintético, seja pela soletração seja pela silabação.
O Annuario de Ensino do Estado de São Paulo de 1909-1910 quando apresenta o relatório assinado por Oscar Thompson, Diretor Geral da Instrução Pública na ocasião, dirigido ao Secretário do Interior, dá base a uma possível explicação para o desaparecimento do debate entre os métodos de ensino da leitura e escrita, nos artigos da Revista de Ensino. Thompson manifesta inicialmente, o esforço que tem dedicado, a Inspetoria, na uniformização do ensino.

No exercicio do cargo que ora occupo, tem sido minha preocupação dominante, em materia de technica do ensino, o debatido e importante problema do ensino da leitura aos analphabetos.
Os esforços e o tempo morosamente absorvidos nos trabalhos de uniformização, sob os novos moldes, do methodo pedagogico para o ensino da leitura - não representam, como à primeira vista pode parecer, um exclusivismo, contra a inteiresa do plano com que á Inspectoria incumbe orientar o professorado na transmissão do ensino das demais disciplinas do programma escolar. Accentuar em linhas geraes, o systema que deve ser posto em pratica pelo professor no sentido de dirigir seus alumnos em todas as materias pelos meios mais de accordo com as leis do espirito - tal o interesse capital da Inspectoria do Ensino, como repartição technica (Annuario de Ensino, 1909-1910, p.8).


Isto posto, determina o autor e Diretor da Instrução Pública, as linhas gerais do que deve ser posto em prática pelo professor. O método analítico é indicado para o ensino da leitura e escrita como o caminho mais compatível com a natureza humana.

Effectivamente, não há processo mais compativel com a nossa natureza para ensinar a pensar, do que o aconselhado para a execução do methodo analytico no apprendizado da leitura.(...)
Em resumo: 1º a idéa, 2º a sentença, 3º o vocabulo - taes são os três passos capitaes do moderno methodo de leitura analytica, de accordo com a marcha natural do espirito humano na investigação da verdade, no estudo e comprehensão das coisas e dos factos.
Si o methodo analytico sob o ponto de vista geral e philosophico é o methodo por excellencia, por isso que parte da idéa geral do conjuncto - para as suas partes, do concrecto para o abstracto, do todo - que impressiona claramente a imaginação - para o elemento indivisivel que é monotono, arido e insignificativo; não é de extranhar que elle tenha a sua primeira applicação pedagógica no ensino da leitura, a qual é inquestionavelmente uma operação essencialmente analytica do espirito (Annuario de Ensino, 1909-1910, pp.8 e 9).

Thompson explica que, partindo da idéia para a sentença e posteriomente para o vocábulo, o método analítico é o único que, no ensino da leitura e escrita, desenvolve uma operação essencialmente analítica, respeitando a marcha natural de aquisição de conhecimento do espírito humano. Estabelece assim, o oficialidade do método analítico para o ensino da leitura e escrita.
No exame dos demais números do Annuario, registra-se a publicação de 1911-1912 que traz o relatório - Instruções aos Srs. Inspetores Escolares -, do então Diretor Geral da Instrução Pública João Chrysostomo Bueno dos Reis Junior ao Secretário do Interior, o Exmo. Sr. Dr. Altino Arantes, pelo qual reafirma a oficialidade do método analítico para o ensino de leitura e escrita.

Afim de facilitar a uniformidade de orientação do ensino, fica, em linhas geraes, estabelecido:(...) Leitura em grupos escolares - aos analphabetos pelo methodo analytico; em escolas isoladas pela palavração.(...) Leitura e linguagem (em todas as classes) exigir a fiel observância do manual “Como ensinar leitura e linguagem nos diversos annos”  (Annuario de Ensino, 1911-1912, p.21).[12]

Assim, Thompson e Reis Junior sustentam a pertinência da utilização do método analítico para o ensino da leitura e escrita, determinando a oficialidade de sua aplicação.
Os motivos pelos quais a Revista de Ensino retira de suas páginas o debate entre os métodos de leitura e escrita podem ser explicados pelo fato de que com Thompson e Reis Junior o método analítico conquistara foros de oficialidade. Nesse período, em que é determinada a oficialidade do método analítico, a Revista de Ensino está sob os auspícios da Diretoria Geral da Instrução Pública de São Paulo[13].
Se, de um lado, o debate entre método analítico e o método sintético desaparece dos artigos da Revista de Ensino após a oficialização do método analítico para o ensino da leitura e escrita, de outro, a aplicação de ambos permanece nos programas de ensino determinados pelas leis e decretos do ensino público de São Paulo.
Com o Decreto nº2005 de 13 de fevereiro de 1911, o programa de ensino de leitura e escrita para as Escolas-Modelo Isoladas[14] passa a ministrar as seguintes matérias  para a 1ª seção:

Quadro 1.4
 Programa de Ensino das Escolas-Modelo Isoladas - Decreto nº2005 - 13/02/1911

Leitura
Ler, primeiro no quadro negro e depois no livro, palavras fáceis e entrelaçadas em sentenças sob a forma enunciativa, interrogativa e exclamativa. Exercícios sobre palavras similares e rimas. Análise das palavras em seus elementos, sílabas e letras.
Linguagem Oral
Palestras com os alunos sobre coisas em cenas de fácil observação, relativas ao lar, a rua, a escola e ao campo. Enumeração. Exercícios de comparação, forma, tamanho, cor e serventia. Reprodução de fatos sugestivos, lidos ou melhor, contados pelo professor.
Linguagem Escrita
Copiar: nomes de objetos, animais, flores e frutas; sentenças do quadro-negro e do livro de leitura; nomes de colegas, dias da semana, dos meses, das estações etc.
Completar sentenças escritas no quadro-negro e que já tenham sido lidas no livro.
Construir sentenças em respostas a outras escritas pelo professor no quadro negro.
Exercícios retrospectivos de palavras escritas rapidamente e de memória pelos alunos, sob aposta.
Ditado de sentenças do livro de leitura.
Caligrafia
Cópia de sentenças escritas pelo professor no quadro-negro, onde apareçam palavras formadas de letras de  elementos simples. Cópia de sentenças escritas pelo professor no quadro-negro, onde apareçam palavras formadas de letras com haste para cima.
 Cópia de sentenças escritas pelo professor no quadro-negro, onde apareçam palavras formadas de letras com haste para baixo.

Fonte: Elaborado com base no Decreto nº2005/1911, publicado na Coleção das Leis e Decretos do Estado de São Paulo - 1889-1920.


Porém, para as Escolas de Bairro, são determinados, com o Decreto nº2368 de 14 de abril de 1913, as matérias e o programa de ensino, conforme quadro abaixo. Para a 1ª seção[15]:
Quadro 1.5
Programa de Ensino das Escolas de Bairro -Decreto nº2368 - 14/04/1913

Leitura
Aprendizagem da leitura pelo método fônico da silabação, em cartilha apropriada.
Linguagem Oral
Palestras sobre objetos de casa, da escola, da roça etc. que os alunos conheçam e tenham observado. Nomes e qualidades de plantas, de animais domésticos, de frutos e árvores frutíferas, etc. Palestras sobre cor, forma, tamanho e serventia dos objetos. Pequenas descrições feitas pelos alunos com auxilio do professor, de objetos, de plantas, de animais etc.
Linguagem Escrita
Cópia de palavras e sentenças do quadro-negro e do livro de leitura. Escrita de nomes de objetos, de plantas, de frutos de animais. Cópia de pequenos trechos do livro de leitura. Completar sentenças escritas pelo professor no quadro-negro. Construção de sentenças com palavras dadas pelo professor.
Educação Cívica
Deveres das crianças para com os seus colegas, irmãos, pais e mestres. Deveres da caridade. Deveres para com os superiores e inferiores. Deveres a que estão sujeitos nos lugares públicos. Deveres para com as autoridades. A verdade e a mentira. A delação e a traição. O orgulho. O egoísmo. A honra. Nomes da localidade, da cidade, do Estado, do País em que a criança nasceu.
Caligrafia
Cópia a lápis e em papel de palavras da lição de leitura, escritas pelo professor no quadro-negro. Cópia de pequenos trechos do livro de leitura.

Fonte: Elaborado com base no Decreto nº2368/1913, publicado na Coleção das Leis e Decretos do Estado de São Paulo - 1889-1920.

Observando, então, o ensino de leitura no programa das Escolas-Modelo Isoladas, determinado pelo Decreto nº2005, de 1911, é possível verificar que a orientação oficial de aplicar o método analítico para o ensino de leitura é obedecida. O mesmo não acontece com a determinação do Decreto nº2368, de 1913, que estabelece para as Escolas de Bairro um ensino de leitura pelo método fônico da silabação, com cartilha apropriada. Observa-se também que se para o ensino das Escolas-Modelo Isoladas não é determinado o ensino de moral e civismo, para as Escolas de Bairro, o ensino de educação cívica é detalhado.
Há que se perguntar: por que para as Escolas de Bairro o ensino da leitura deve ser ensinado pelo método fônico de silabação, com cartilha apropriada, se o método analítico para o ensino da leitura está oficializado pela Diretoria Geral da Instrução Pública?
O Annuario de Ensino do Estado de São Paulo informa que há uma diferenciação entre o ensino nas Escolas Isoladas[16], e o ensino nas Escolas-Modelo. No relatório apresentado ao Secretário do Interior pelo Inspetor Escolar Antonio Morato de Carvalho, constante do Annuario de 1908-1909,  o ensino nas Escolas Isoladas encontra-se na seguinte situação,

Não há (...) homogeneidade no emprego de methodos e processos mais convenientes á transmissão de conhecimento aos alumnos. Em algumas, observa-se isto, mais ou menos: o ensino simultâneo é substituído pelo individual; não há uniformidade na adopção de livros para os alumnos de uma mesma classe; no ensino da leitura são geralmente desprezados o giz e o quadro-negro, dando as creanças suas primeiras lições nas cartilhas que decoram; uns ensinam por sylabação e outros até por soletração(!) muitos ensinam a lingua pela gramatica, e não a gramatica pela linguagem, e exigem as definições e regras decoradas ipisis litteris dos compêndios, e que são reproduzidas sem que os alumnos saibam praticamente applical-as; (...) os exercícios de linguagem escrita são quasi por toda a parte desprezados e, quando feitos, não são corrigidos (Annuario de Ensino, 1908-1909,  p.12).

O inspetor escolar René Barreto, em relatório apresentado ao Secretário do Interior, publicado pelo Anuário de Ensino 1908-1908, também oferece informações a respeito:

O estado atual das escolas isoladas continúa a ser muito precário. (...) Isoladas, esquecidas, funccionando em salas sem o necessário espaço, nem condições de luz e de higiene; desprovidas de materias(...), confiadas em sua maior parte a professores inexperientes recém-formados as escolas produzem benefícios que ficam assás aquém dos sacrifícios que custam ao professor e ao thesouro  (Annuario de Ensino, 1908-1908, p.81).

Com as informações fornecidas pelos relatórios de Carvalho e Barreto é possível verificar que as Escolas de Bairro, que são espécies de escolas isoladas pois pertencem à zona rural, mantêm condições muito precárias de funcionamento; ao contrário das Escolas-Modelo Isoladas, que por serem anexas a Escola Normal de São Paulo, gozam de situação mais privilegiada. Além disso, os profissionais enviados às Escolas de Bairro não acumulam experiência suficiente para desempenhar um trabalho satisfatório, no que diz respeito ao ensino da leitura e escrita pelo método analítico. Ao que parece, o ensino da leitura e escrita pelo método de soletração e silabação, já conhecido dos professores, é de mais fácil manuseio. E este é o ponto em que reside a crítica aos métodos de silabação e soletração: estes métodos são fáceis do ponto de vista do adulto que ensina e não do ponto de vista do aluno que aprende. Para que o professor possa ensinar pelo método analítico deve, conforme os argumentos apresentados por Thompson, na determinação da oficialidade do método analítico, obter um conhecimento mais aprofundado sobre a marcha natural do espirito humano na investigação da verdade, no estudo e compreensão das coisas e dos fatos. Deve entender que a primeira aplicação pedagógica no ensino da leitura é, inquestionavelmente, uma operação essencialmente analítica do espírito: primeiro, a idéia; segundo, a sentença; terceiro, o vocábulo. Uma vez que esse conhecimento não está difundido entre os todos os profissionais, o ensino da leitura e escrita é assegurado com os métodos já conhecidos, o de soletração ou silabação.
Verifica-se, também, que para o ensino nas Escolas de Bairro é determinado um ensino cívico e moral, que não é incluído no programa de ensino das Escolas-Modelo Isoladas. Se nas Escolas-Modelo Isoladas o ensino da leitura e escrita deveria ser ministrado pelo método analítico, o acesso a uma série de ensinamentos morais e cívicos estaria garantido, uma vez que, pelo método analítico, o ensino da leitura e escrita deve ser iniciado por sentenças e palavras que podem veicular conhecimentos cívicos e morais. Diferentemente, as Escolas de Bairro devem ministrar o ensino da leitura e da escrita pelo método fônico, com cartilha apropriada, que por sua vez não poderia garantir esses conhecimentos  Daí a necessidade de estabelecer-se um programa especial de moral e civismo para essas escolas.
Se o debate desenvolvido nos artigos da Revista de Ensino, de um lado, revela divergências entre os métodos de ensino da leitura e escrita, de outro, apresenta uma concordância: qualquer que seja o método utilizado para o ensino da leitura e escrita, este deve preparar o cidadão para a nova sociedade. Todos os procedimentos de ensino - analítico pela sentenciação ou pela palavração, sintético pela soletração ou silabação - reafirmam que o aluno deve entender o que está lendo e escrevendo, seja por meio de interjeições, como propõe Cardoso, seja por meio de monossílabos ou ainda, dissílabos acompanhados de figuras ilustrativas, como propõe Roca e Dordal, seja ainda por meio de palavras ou sentenças que exprimam comentários a respeito de desenhos feitos pelo professor ou gravuras ilustrativas, como propõe Kopke. A necessidade de oferecer um ensino em que o aluno possa ler e entender ao mesmo tempo, está agregada ao interesse de que pelo ensino da leitura e escrita, um ensino moral e cívico possa ser ministrado com eficácia de entendimento e aprendizagem. Os programas de ensino revelam que o ensino de moral e civismo deve ser ministrado pelo ensino da leitura e escrita.
Assim, é possível entender que o debate entre os métodos de ensino de leitura e escrita desenvolve-se alimentado pela idéia de que a República, para constituir-se de fato, necessita de cidadãos leitores, porque pelo ensino da leitura e escrita é possível viabilizar a formação de uma certa mentalidade, uma certa moralidade, um certo corpo de condutas compatíveis com a vida republicana. Nesse sentido, é preciso, então, identificar qual o melhor método de ensino que possa melhor formar o cidadão republicano. E a Diretoria Geral da Instrução Pública opta pelo método analítico, tornando-o oficial.
Os motivos que justificam essa escolha são bem explicitados e podem ser verificados na literatura especializada apresentada à época da determinação oficial. O exame da argumentação que justifica a escolha é apresentado a seguir.


 Capítulo II

A oficialidade do Método Analítico:
aprendendo a ler entendendo o que se lê, para tornar-se cidadão







A partir da edição publicada em dezembro de 1911, os artigos da  Revista de Ensino, referentes ao ensino da leitura e escrita, ocupam-se principalmente com a divulgação de três aspectos: os fundamentos pelos quais é sustentada a superioridade do método analítico; a forma correta de sua aplicação e a importância de um ensino moral e cívico agregado ao ensino da leitura e escrita.
Para empreender a divulgação desses aspectos, a Revista de Ensino publica, na edição de dezembro de 1911, ano X, nº3, o artigo Methodos de ensino, sem autor, informando sete definições a respeito. Provavelmente, ao publicar este artigo, a Revista de Ensino expressa, numa espécie de editorial, o entendimento “oficial” das várias definições e conceitos de método esclarecendo, por exemplo, que o método filosófico trata de algo diferente do método pedagógico.

O methodo philosofico é o caminho que segue o espirito humano na investigação e formação do conhecimento científico; Na logica, o methodo consiste na successão ordenada das operações que a intelligencia executa para chegar a verdade; Psychologicamente é o arranjo natural e necessário das funcções mentaes na elaboração e aquisição de conhecimentos; (...) do ponto de vista pedagógico é o plano ordenado que segue o professor no ensino, quando transmitte os conhecimentos para os alunos ou quando faz com que eles descubram por si mesmos... (Revista de Ensino, 1911, p.25).


Além disso, o artigo investe no esclarecimento de como cada método deve proceder no ensino às crianças, demonstrando a relação existente entre o método indutivo e o método analítico, bem como entre o método dedutivo e o método sintético

... o Método Indutivo é o que se vale da inducção e consiste em levar a criança dos exemplos à definição, dos fatos e phenomenos à regra geral. Ele recebe diferentes nomes: analítico porque vae do composto ao simples, do todo a suas partes; intuitivo porque parte da percepção direta dos fatos, phenomenos e exemplos; inventivo porque conduz a criança a descobrir os conhecimentos por seu proprio esforço; de decomposição por que separa as partes de um todo, as classifica e as ordena. Methodo Dedutivo é o que se baseia na deducção, isto é, parte das definições e regras para os exemplos e as applicações. (...) É conhecido sob diversos nomes: synthetico porque marcha do simples para o composto, das partes para o todo; demonstrativo por empregar o raciocínio como processo interno; racional ou especulativo porque o seu ponto de partida são as definições e as regras gerais; de decomposição porque reúne as partes e os elementos constitutivos de um todo, separados pela analyse (Revista de Ensino, 1911, pp.26 e 27).


O entendimento das várias definições da palavra “método” pode auxiliar no convencimento dos professores a respeito da viabilidade da aplicação do método analítico. E a edição de dezembro de 1911, ano X, nº3, investindo nestes esclarecimentos, publica também o artigo de Argymiro Acayaba  A propósito da Leitura Analítica. Para o autor, o método analítico não deve seguir a ordem lógica e sim a psicológica.

A mais repetida accusação que se faz ao methodo analytico é a de ser illogico. (...) O ensino da leitura deve seguir a ordem psychologica e não a ordem logica. Para quem sabe que a mentalidade infantil se desabrocha em evidente parallelismo com o marcha da civilização humana, e que o phenomeno da linguagem evolue na criança como evoluiu na humanidade, o ensino analytico representa meramente a conformidade da aprendizagem systematica com a aprendizagem espontanea, que é a sabia modeladora das modernas instituições da educação  (Acayaba, 1911, p.59).

Acayaba assinala, primeiramente, a existência de críticas dirigidas ao método analítico de ensino da leitura e escrita, o que evidencia a continuidade do debate sobre os métodos, mesmo que a Revista não apresente nenhum artigo contrário ao método analítico. Provavelmente, uma confusão na conceituação do método analítico estaria prejudicando a sua aplicação, e, por isso, exigindo esclarecimentos.
Além disso, Acayaba afirma que o ensino da leitura deve seguir a ordem psicológica e não a ordem lógica, trazendo à cena da discussão a Psicologia como fundamento da superioridade do método analítico. Esse artigo de Acayaba pode ser entendido como uma outra tentativa de esclarecer os motivos que levam a Diretoria Geral da Instrução Pública a oficializar o método analítico, como o mais adequado para o ensino da leitura e escrita. A presença da Psicologia justificando a superioridade do método analítico já pode ser constatada tanto nos artigos que encerram o debate sobre os métodos de ensino, quando a Revista ainda se ocupa em divulgá-lo, por exemplo, o artigo A leitura analytica de Carlos Escobar, da edição de setembro de 1911, ano X, nº2, bem como no Annuario de Ensino de 1910-1911 com a justificativa de Oscar Thompson, Diretor Geral da Instrução Pública, ao divulgar a oficialidade do método analítico.
Oscar Thompson, investindo também na divulgação de argumentos que justificam a superioridade do método analítico para o ensino da leitura e escrita, e em concordância com a argumentação de Acayaba, de que o ensino deve seguir a ordem psicológica e não a ordem lógica, assina um texto, no Annuario de Ensino de 1909-1910, dirigido Secretário do Interior, sob o título de Bases Psychologicas do Methodo Analytico para o Ensino da Leitura, no qual explica que

Quem se propõe a ensinar deve ter presente no decurso de todo o seu trabalho educativo que a ordem psychologica do desenvolvimento de uma materia não é sempre a ordem logica.(...)
O acto de apprender envolve duas operações do espirito: acquisição e assimilação.(...)
O methodo de acquisição é analytico, partindo do todo, do conjuncto, para as partes, para os detalhes. (...)
É geral, é de conjuncto a primeira impressão -o espirito não tem consciencia dos detalhes em primeiro logar  (Annuario de Ensino, 1909-1910, p.166).


Com seu texto, Thompson esclarece que a ordem psicológica no ensino da leitura e escrita é a ordem analítica. Reafirma que a primeira impressão no ato de aprender é de conjunto, não se tendo consciência dos detalhes num primeiro momento.
O autor explica ainda que, partindo do todo, do conjunto - a sentença - para as partes, para os detalhes - as palavras, sílabas e letras - o método analítico garante a aprendizagem da leitura e da escrita através de um processo compatível com estrutura mental de aquisição de conhecimento.


Ao processo analytico por que se apprende corresponde o methodo analytico por que se ensina.
(...) pela ordem logica ou scientifica, as letras devem ser ensinadas em primeiro logar, depois, as sylabas, a combinação destas em palavras e, por ultimo, o entrelaçamento dos vocabulos em sentenças.
Segundo o methodo analytico:
I- a marcha é a que estabelece como principio fundamental a associação do pensamento, das idéas com as sentenças e palavras impressas ou manuscritas. Ler é pensar, é o despertar da actividade mental pela acção dessas sentenças e palavras impressas ou manuscritas.
II- A ordem é psychologica e não logica.(...)
A sentença -ponto de partida no ensino da leitura- é a unidade de pensamento, uma fonte de interesse, um admiravel instrumento de expressão para o alumno (Annuario de Ensino, 1909-1910, p.168).

As contribuições da Psicologia são determinantes na escolha oficial do método analítico para o ensino da leitura e escrita. Sampaio Dória, professor da disciplina Psicologia, Pedagogia e Educação Cívica da Escola Normal Secundária de São Paulo, a partir de 1914 (Carvalho, 1997, p.281), refere-se à importância da Psicologia na determinação dos programas e procedimentos de ensino. 

Sem os dados da psicologia da criança, os programmas que se organizassem, seriam para seres abstractos, irreais, sem necessidades fisiológicas próprias, sem condições de vida e desenvolvimento, seres que a imaginação dos adultos se compraz em criar, segundo o modelo de sua própria imagem, quando é já uma vulgaridade repetir-se, (...) que a criança não é um homem em ponto pequeno, tem sua psicologia própria, e que  não ha duas crianças de mentalidades idênticas como não ha dois rostos absolutamente inconfundíveis.(...) Ora si a alma da criança é tão diversa da do homem feito, si, ainda, a psicologia infantil varia de criança a criança, como determinar as matérias ensináveis, e os modos d’ensino com os olhos fitos na psicologia do adulto, tão diferente das leis que regem a evolução da alma infantil? (Sampaio Dória, 1914, pp.11 e 12)

Em verdade, leis e decretos do ensino público paulista manifestam a intenção de acolher as contribuições da Psicologia na organização do ensino, bem antes dos argumentos de Thompson e Dória. Por exemplo, pelo Decreto nº248 de 26 de julho de 1894, as lições do curso preliminar devem ser mais  empíricas e concretas que abstratas e teóricas. Devem provocar um desenvolvimento gradual e harmônico das faculdades infantis, principalmente da faculdade da observação por meio de processos intuitivos[17].
De julho de 1894, data do Decreto nº248, para 1914, data da publicação da obra Princípios de Pedagogia de Sampaio Dória, a ciência psicológica, certamente, havia se desenvolvido. Em 1930, Lourenço Filho publica Introdução ao Estudo da Escola Nova, livro que reúne as lições que ministrou num curso realizado no Instituto de Educação, antiga Escola Normal Secundária. (Carvalho, 1997, p.281). Neste, o autor informa que em meados do século passado cria-se uma ciência unitária da criança - a Pedologia - que cuida de investigar o comportamento global da criança sem distinguir entre aspectos do domínio da Biologia ou da Psicologia. Porém, a necessidade de aprofundamento do conhecimento da natureza infantil, impulsiona um maior detalhamento das investigações e a delimitação dos domínios da Biologia bem como da Psicologia. Assim, os procedimentos, já utilizados nas investigações dos aspectos biológicos infantis, começam a ser utilizados nas investigações dos aspectos psicológicos, resultando assim num conjunto de descobertas que compõe o campo da psicologia infantil.

Às transformações de método no estudo psicológico caberia a lenta revisão desses pressupostos com mudança correlativa das conclusões. Não se torna preciso repetir que a ação dos pedologistas nisso desempenhou importante papel. Formulada como estudo integral da criança, a pedologia afirmava a unidade do ser humano, propondo-se estudá-la ao longo das diferentes fases ou períodos de desenvolvimento. Mas a nova orientação só em começos deste século, veio a florescer, imprimindo unidade a investigações fragmentárias, dantes tentadas. Assim se constituiu uma psicologia descritiva da infância, na qual depois se apoiou estudo similar para as idades subsequentes. Passou-se a cogitar das diferenças individuais e, quase ao mesmo tempo, dos processos de aprender. Investigados estes, a princípio, na memória do adulto (Ebbinghaus,1885), logo se encaminharam para a solução dos problemas de aprendizagem na infância (Lay, Meumann, Binet, Thorndike), já nos últimos anos do século passado  (Lourenço Filho, 1930, p.61).

Além da idéia de que o método analítico é o único compatível com a marcha natural de aquisição de conhecimento, à Psicologia também cabe informar, em que consiste o processo mental percorrido pela mente humana na aprendizagem de algum conhecimento. Que o processo de aprender é essencialmente analítico, porque inicia pela idéia do conjunto, do todo,  para depois ir conhecendo os detalhes, as partes, informa Oscar Thompson, mas, a justificativa deste procedimento mental é encontrada em Sampaio Dória,

...uma vez nascida, a criança se desenvolve como se desenvolveu a  raça. A esta lei se tem dado o nome da recapitulação abreviada. É suprema a sua importância na sciência do ensino. Porque, sendo exato que o desenvolvimento da criança reproduz abreviadamente a evolução da espécie, claro está que a criança se ha de educar como a natureza educou o gênero humano. Na marcha progressiva da civilização se pode buscar o critério infalível para a transmissão dos conhecimentos, com o fito de ajudar a evolução natural e espontânea da criança, preparando-a para a vida completa. (...) As faculdades desenvolvem-se no indivíduo infante, como se desenvolveram na espécie nascente. A diferença entre o processo histórico da civilização e o processo escolar da educação está unicamente na vantagem que o adeantado gráu do desenvolvimento humano lhe proporciona hoje, de reunir e condensar as aquisições acumuladas pelos séculos, facilitando á primeira expansão da inteligência individual no ensino as condições de experiência e observação, tão difíceis á humanidade nos primeiros estados do seu desenvolvimento  (Sampaio Dória, 1914, pp.14 e 20).

Uma vez entendido que a marcha natural de aquisição de conhecimento corresponde ao processo pelo qual a humanidade constrói o conhecimento universal, da noção de conjunto para o conhecimento das partes, da noção do todo para o conhecimento dos detalhes, mais é reafirmada a superioridade do método analítico para o ensino da leitura e escrita. Isto porque, pelo método analítico, o ensino da leitura e escrita deve partir do conjunto, a frase, para o conhecimento dos detalhes, as letras. Pelo método analítico é possível encaminhar o ensino da leitura e escrita com base no processo de evolução da humanidade.
A Revista de Ensino, além de preocupar-se em divulgar os argumentos que dão sustento à tese da superioridade do método analítico, trazidos da Psicologia, bem como a maneira correta de sua aplicação, preocupa-se também em divulgar a importância de um ensino moral e cívico, agregado ao ensino de leitura e escrita.
A edição de dezembro de 1911, ano X, nº3, apresenta o artigo O conceito de leitura assinado por Guilherme Carabajal. Neste, o autor afirma que o livro de leitura deve ter um valor educativo. É pela leitura, que a educação moral deve ser ministrada.

O livro de leitura deve ter antes de tudo um valor educativo. A educação moral, como sabemos, anda um tanto descuidada e a leitura deve ser um meio de reação. Além disso, deve tender a formar o gosto, despertando o amor pelo belo. (...) O livro de leitura, para ser bom, requer muitas condições. Deve em primeiro logar adaptar-se á idade e á capacidade da criança. Deve ser obra de um meditado estudo sobre o logar, a nacionalidade, a historia e tradição popular. (...) um pequeno tratado de consulta que dê ao menino conhecimentos fundamentaes da historia, da tradição, da poesia, do pais, do povo, de todos os deveres do cidadão  (Carabajal, 1911, pp.66 e 67).

O artigo de Carabajal é explícito: através da leitura, a criança deve aprender todos os deveres de cidadão. E a Revista de Ensino não poupa esforços para reafirmar a idéia de que é pelo ensino da leitura e escrita que deve ser ministrado um ensino moral e cívico. As publicações apresentadas a seguir têm para cada artigo que se refere a aplicação do método analítico, um artigo sobre a importância do ensino moral e cívico sempre agregado ao ensino de leitura e escrita.
Na tentativa de esclarecer a respeito da correta aplicação do método analítico no ensino da leitura e escrita, a edição de dezembro de 1911, ano X, nº3, publica o artigo O ensino da leitura assinado por B. M. Tolosa. O autor demonstra, como deve ser empregado o método analítico pela sentenciação no ensino da leitura e escrita.

A introdução do methodo analytico veio facilitar muito a apprendizagem da leitura.
Antigamente as pobres crianças tinham de aprender a significação dos elementos graphicos, palavras, sylabas ou letras, por intermedio dos pensamentos de outras pessoas, isto é, tinham de aprender o desconhecido pelo desconhecido. Hoje aprendem a ler os elementos graphicos por intermedio de um elemento conhecido, pois que a sentença lançada no quadro-negro é explicada por e pelos seus próprios pensamentos. E assim ellas fixam ás formas de cada elemento graphico uma idea sua, e por intermedio dessa mesma fixação, ellas poderão traduzir as idéas alheias  (Tolosa, 1911, p.88).

Tolosa apresenta com seu artigo algumas vantagens do método analítico pela sentenciação e esclarece também que esta fase do ensino da leitura deve ser iniciada aproveitando as sentenças da cartilha. No trabalho com as sentenças, o professor deve sugerir a decomposição das sentenças em palavras. Antes porém, dessa decomposição, e após o trabalho de reconhecimento das sentenças, os alunos devem receber a cartilha, para que nela sejam lidas as sentenças já aprendidas por eles. A distribuição da cartilha deve ser feita  “... com caracter festivo, de modo que se grave sympaticamente no espirito da criança esse memoravel dia de sua vida” (Tolosa, 1911, p.89). Certamente, Tolosa está preocupado em orientar os professores em como utilizar o método analítico. O autor apresenta detalhadamente em que momento deve ser entregue a cartilha, e como deve ser feita esta entrega.
Na edição de junho de 1912, ano XI, nº1, a Revista de Ensino apresenta Luiz Cardoso assinando o artigo Educação Analytica. Neste, o autor relaciona ciência e moral. Para ele, é necessário que conhecimento e moralidade estejam presentes nas escolhas do que ensinar para o aprendiz. Para o autor,

Estabelecer-se, pois, a verdadeira nórma de conducta em todas as situações, em todas as circumstancias da vida, torna-se um facto de imprescindivel necessidade.
O cuidado com o corpo, da intelligencia e dos deveres moraes; as coisas relativas ao bem estar, á educação da familia, ao desempenho dos deveres do cidadão; a emulação, oriunda dos proprios factos naturaes, o emprego espontaneo de nossas faculdades em proveito proprio e da sociedade em geral, são outros tantos problemas, cuja solução redunda em proveito da vida completa, em proveito da causa social. Habilitar-nos para a vida completa é, pois, o fim da educação  (Cardoso, 1912, p.26).

Cardoso chama a atenção para o fato de que a educação deve preparar o cidadão para a vida completa. Cuidar do corpo, da inteligência e dos deveres morais devem ser as principais tarefas da educação.
Também nesta edição, B. M. Tolosa retorna com a discussão a respeito de como processar o método analítico adequadamente. Assinando o artigo Em classe e para a classe - O ensino da leitura, afirma que para uma criança aprender a ler não precisa necessariamente desenvolver a análise ao ponto da letra:

Cabe-nos aqui explicar um ponto, que se acha obscurecido pela natural resistencia encontrada pelo methodo analytico nas nossas escolas. Com o fim de depreciar esse methodo, dizem alguns collegas que elle afinal, nada é mais do que uma syllabação disfarçada, porque sempre aconselhamos a decomposição das palavras em syllabas e destas em lettras, e que com este ultimo passo é que realmente ensinamos a lêr. Não. É preciso que nos entendamos com toda a sinceridade, e que ponhamos em boa disposição os termos da questão.
Quando chegamos á syllaba, as crianças já realmente sabem lêr, e si levamos a analyse até ahi, é para completar a arte da leitura, fornecendo-lhes os meios para sahirem-se de uma ou outra difficuldade, que as numerosas excepções da lingua offerecem muitas vezes.
O conhecimento das syllabas não é pois um fim, nem um meio, no ensino da leitura. Não é um fim porque ninguem ensinará a lêr ás crianças com o fim de conhecer syllabas, e não é tão pouco um meio, porque com a adopção do methodo analytico, não se usa mais a syllaba como meio de se conseguir a leitura. A syllabação final é apenas um complemento ao trabalho feito e não realmente uma necessidade  (Tolosa, 1912, p.76).

Embora a Revista de Ensino não mais publique artigos em defesa do método sintético, com o artigo de Tolosa verifica-se que o debate sobre os métodos de ensino de leitura e escrita não deixa de existir. Em verdade, o debate continua, porém com outro teor, pois há agora, uma preocupação prática mais explícita, bem como uma disposição em apresentar quais aspectos científicos e morais fundamentam a pertinência dos métodos.
O autor, além de esclarecer que o lugar da silabação na utilização do método analítico é de pouca importância, afirma também, que qualquer cartilha pode ser utilizada, desde que o professor aplique  “... a processuação analytica da primeira á ultima pagina, de accôrdo com o desenvolvimento de seus alumnos” (Tolosa, 1912, p.76). Neste artigo utiliza-se da Cartilha das Mães para demonstrar a aplicação do método analítico.
Tolosa, apresenta a aplicação do método analítico, utilizando a Cartilha das Mães, assim:

                                         Figura 2.1
Orientação para a aplicação do método analítico a partir das lições da 
                  Cartilha das Mães, de Arnaldo Olveira Barreto.
      Fonte: Revista de Ensino, edição de junho de 1912, ano XI, nº 1.




                                          Figura 2.2
Orientação para a aplicação do método analítico a partir das lições da 
                  Cartilha das Mães, de Arnaldo Olveira Barreto.

        Fonte: Revista de Ensino, edição de junho de 1912, anoXI, nº1

As lições da Cartilha das Mães as quais refere-se Tolosa, para a demonstração da aplicação do método analítico são as que se seguem:




                                               Figura 2.3
                Lição da Cartilha das Mães, de Arnaldo Oliveira Barreto
Fonte: Cartilha das Mães, de Arnaldo Oliveira Barreto, 49ª edição, 1938.



                                           Figura 2.4
             Lição da Cartilha das Mães, de Arnaldo Oliveira Barreto
 Fonte: Cartilha das Mães, de Arnaldo Oliveira Barreto, 49ª edição, 1938.




                                           Figura 2.5
              Lição da Cartilha das Mães, de Arnaldo Oliveira Barreto
 Fonte: Cartilha das Mães, de Arnaldo Oliveira Barreto, 49ª edição, 1938




Tolosa também alerta para o momento adequado da introdução da análise das palavras em sílabas e letras. Somente após um trabalho feito com sentenças e palavras é que pode ser encaminhada a análise, utilizando então, os exercícios da Cartilha das Mães.
Além disso, afirma o autor que, se o trabalho de ensino da leitura for bem feito, não há necessidade de um livro intermediário entre a Cartilha e o 1º livro de Leituras de João Kopke. Contudo, vale a pena atentar para o conteúdo das leituras do livro de Kopke. Com a denominação de 1º Livro de Leituras Morais e Instrutivas, Kopke segue a mesma orientação apresentada por Guilherme Carabajal que, na edição de dezembro de 1911, ano X, nº3, apresenta o artigo O conceito de leitura no qual afirma que, o livro de leitura deve ter um valor educativo. Observa-se também, que as histórias apresentadas no livro de Kopke correspondem à orientação dos programas de ensino de moral e civismo.
Com o Decreto nº248 de 26 de julho de 1894, é determinado o programa de educação moral e cívica para o 1º ano das Escolas Preliminares:

Quadro 2.1
 Programa de Ensino de Moral e Cívica para as Escolas Preliminares
 Decreto nº248 - 26/07/1894

Educação Moral e Cívica
Hábitos de ordem, comportamento na escola, em casa, na rua e em lugares públicos, deveres para com os pais e superiores, iguais e inferiores, tratamento adequado aos animais, máximas que desenvolvam boas qualidades, nomes das principais autoridades do lugar, do estado e do país, leitura de palavras que despertem idéias nacionais tais como: cidadão, soldado, exército.

Fonte: Elaborado com base no Decreto nº248/1894, publicado na Coleção das Leis e Decretos do Estado de São Paulo - 1889-1920.

Com o Decreto nº1217 de 29 de abril de 1904, é determinado o programa de instrução cívica e moral para os Grupos Escolares e Escolas-Modelo:





Quadro 2.2
 Programa de Instrução Cívica e Moral para os Grupos Escolares e
Escolas-Modelo - Decreto nº1217 - 29/04/1904

Instrução Cívica e Moral
Não figura dos horários. Constitui o assunto de lições de linguagem: trechos morais, trechos cívicos, adágios populares, pequenas poesias, historietas.

Fonte: Elaborado com base no Decreto nº1217/1904, publicado na Coleção das      Leis e Decretos do Estado de São Paulo - 1889-1920.

E com o Decreto nº2368 de 14 de abril de 1913, é determinado, para as Escolas de Bairro, o programa de moral e civismo conforme quadro abaixo. Para a 1ª seção:

Quadro 2.3
 Programa de Educação Cívica  para as Escolas de Bairro -
                              Decreto nº2368 - 14/04/1913

Educação Cívica
Deveres das crianças para com os seus colegas, irmãos, pais e mestres. Deveres da caridade. Deveres para com os superiores e inferiores. Deveres a que estão sujeitos nos lugares públicos. Deveres para com as autoridades. A verdade e a mentira. A delação e a traição. O orgulho. O egoísmo. A honra. Nomes da localidade, da cidade, do Estado, do País em que a criança nasceu.

Fonte: Elaborado com base no Decreto nº2368/1913, publicado na Coleção das Leis e Decretos do Estado de São Paulo - 1889-1920.


A seguir, algumas das histórias do livro de Kopke, que correspondem às lições indicadas nos programas apresentados acima:








                                      Figura 2.6
   Lição do 1º Livro de Leituras Morais e Instrutivas de João Kopke
           Fonte: 1º Livro de Leituras Morais e Instrutivas, de João Kopke, 90º edição, 1942



                                      Figura 2.7
   Lição do 1º Livro de Leituras Morais e Instrutivas, de João Kopke
         Fonte: 1º Livro de Leituras Morais e Instrutivas, de João Kopke, 90ª edição, 1942




                                       Figura 2.8
Lição do 1º Livro de Leituras Morais e Instrutivas, de João Kopke
           Fonte: 1º Livro de Leituras Morais e Instrutivas, de João Kopke, 90ª edição, 1942.





                                        Figura 2.9
    Lição do 1º Livro de Leituras Morais e Instrutivas de João Kopke
              Fonte: 1º Livro de Leitura Morais e Instrutivas, de João Kopke, 90ª edição, 1942.







                                 Figura 2.10
Lição do 1º Livro de Leitura Morais e Instrutivas, de João Kopke
       Fonte: 1º Livro de Leitura Morais e Instrutivas, de João Kopke, 90ª edição, 1942.











                                      Figura 2.11
Lição do 1º Livro de Leitura Morais e Instrutivas, de João Kopke
        Fonte: 1º Livro de Leitura Morais e Instrutivas, de João Kopke, 90ª edição, 1942.









                      INSERIR FIGURA FALTANTE

                                       Figura 2.13
Lição do 1º Livro de Leitura Morais e Instrutivas, de João Kopke
        Fonte: 1º Livro de Leitura Morais e Instrutivas, de João Kopke, 90ª edição, 1942.




                                   Figura 2.14
Lição do 1º Livro de Leitura Morais e Instrutivas, de João Kopke
        Fonte: 1º Livro de Leitura Morais e Instrutivas, de João Kopke, 90ª edição, 1942.

Tratando de temas como: a preguiça, a importância do trabalho, a importância da obediência aos pais, as maneiras adequadas de comportamento infantil e tantos outros, Kopke apresenta um verdadeiro conjunto de lições que devem preparar o menino e a menina para a aquisição de novos valores compatíveis com a nova sociedade republicana.
Fazendo parte da Série Rangel Pestana, que tem por objetivo ministrar um curso de língua materna[18], o livro de Kopke apresenta na sua introdução, uma preocupação relevante para o entendimento do motivo de ser o primeiro livro de leituras, composto de leituras morais e instrutivas:

Crente de que, por esta forma, sem prejudicar o livro, avantajou o caminho àqueles que querem mais alguma cousa de seu ensino do que a facilidade da leitura, conta o autor com indulgência para o que fez mal, e suplemento do que não atingiu, pois disso é que hão mister os escritores didáticos e a infância a instruir  (Kopke, 1942).

Querer algo mais que a facilidade da leitura, evidentemente, é querer uma educação moral e cívica que tenha por objetivo preparar o aluno para uma vida completa, para uma vida republicana.
A edição de março de 1913, ano XI, nº4, apresenta o artigo O ensino da língua materna assinado por C. Braga. O autor afirma que, o fim da escola não deve ser  apenas ensinar a ler, mas também com sua primeira lição de leitura, iniciar um perfeito conhecimento da língua materna, porque a língua, segundo ele, é o depósito de todos os pensamentos de uma nação e é nela que se concretizam as idéias de todos os nossos antecedentes.

Si a lingua é o deposito de todos os pensamentos de uma nação; si e nella que se concretisam as ideas de todos os homens que nos antecederam (...) é lógico que o apprendizado firme e consciencioso da lingua se torna de real e indiscutivel importancia (...).
O aprendizado da língua materna é a base mais solida e indestructivel para uma boa educação primaria (...) é com sua primaria lição de leitura que a criança deve ser iniciada no perfeito conhecimento da lingua  (Braga, 1913, pp.31 e 32).

Provavelmente, os escritos de Kopke e Braga pretendem informar que ensinar a língua materna significa ensinar um conjunto de conhecimentos morais e cívicos. Se a língua é o depósito de todos os pensamentos de uma nação, nada mais natural que pelo ensino da leitura da língua materna, ensinar também um conjunto de conteúdos que transmite a maneira adequada de viver na nova nação constituída, a nação republicana.
O artigo de Braga é a reafirmação da necessidade de que através da leitura  um conteúdo moral e cívico deve ser transmitido, para o êxito da aprendizagem da língua materna, para o êxito da constituição do regime republicano.
Braga ainda acrescenta que, para um perfeito ensino da língua é necessário o auxílio das lições de coisas. Mas, ele não inaugura esta defesa. Tanto em outros artigos da Revista como no exame da leis e decretos do Ensino Público Paulista observa-se a presença das lições de coisas no processo de ensino da leitura e escrita. Por exemplo, nos primeiros artigos da Revista de Ensino, assinados por Kopke e Dordal, quando debatem sobre a necessidade de gravuras para iniciar o ensino da leitura e escrita pelo método analítico de palavração ou quando o Decreto nº248 de 26 de julho de 1894 determina que as lições do curso preliminar devem ser mais empíricas e concretas que abstratas e teóricas, devendo provocar um desenvolvimento gradual e harmônico das faculdades infantis, principalmente da faculdade da observação por meio de processos intuitivos ou ainda quando os programas de ensino orientam que o ensino de leitura e escrita deve ser iniciado pela observação de objetos ou gravuras que representem a idéia concreta dos mesmos.
Além disso, o parecer-projeto que propõe a reforma do ensino primário em 1883, de autoria de Rui Barbosa, já afirmava a relevância do ensino por meio de lições de coisas .

.... É pelos sentidos que o menino tem a primeira noção dos fenômenos exteriores; é por eles, pois que se há de encetar a educação racional: o seu metódico emprego constitue o primeiro modo de exploração científica: a observação. O primeiro passo, portanto, no cultivo do entendimento, é o cultivo dos sentidos, que constitue propriamente a lição de coisas  (Barbosa, 1946, p.63).

Alguns anos depois, Rui Barbosa traduz e adapta para a língua portuguesa a obra de N. A. Calkins, Primeiras Lições de Coisas - Manual do Ensino Elementar (1886), que indica o método analítico como o mais adequado para o ensino da leitura e escrita.

Para firmar o hábito de ler com desembaraço e entoação natural, eduque-se a creança desde o começo em olhar os vocabulos impressos como signaes de objectos, actos e pensamentos. A forma e o som da palavra hão de associar-se á coisa ou á idéa representada. Nenhum sentido encerra, para espiritos infantis, qualquer locução impressa ou fallada, enquanto não symbolizar uma idéa, ou coisa, que já lhes seja familiar.
Abastae da maior copia de idéas que puderdes o entendimento das creanças, associando ás idéas as palavras falladas, que as representarem. Conhecido pelo menino o som audível, que cada idéa corresponde, fácil lhe será, dentro de muito breve, reconhecer o symbolo visivel della, sem referência ás lettras que compõem o vocabulo escripto, nem aos sons que as lettras indicam. Muito mais efficacia encerra este methodo, no ensino da leitura, do que a pratica usual de fazer atravessar ao alumno um fatigante processo synthetico, que lhe é de todo o ponto imcomprehensivel. Medrando de dia em dia no conhecimento das coisas e na aptidão de conhecel-as, a mente da creança não se satisfará por muito tempo com a figura geral das palavras, em que se expressam, na escripta, os nomes dos objectos de sua predilecção, e entrará a sentir necessidade de discernir as lettras. Esse espontaneo pendor de investigar determina o momento, em que deve ter o princípio o ensino dos sons elementares e suas combinações.  Quanto ao valor  das  lettras,  esse toca a processos mais complicados, que dizem melhor a um estado de cultura mental superior ao existente no passo inicial da leitura  (Calkins, 1886, pp.435 e 436).

Em verdade, as várias orientações que indicam que o ensino da leitura e escrita deve ser iniciado por meio de processos intuitivos, pela observação de objetos ou gravuras que representem a idéia concreta dos mesmos, ou ainda pelas lições de coisas, podem ser resumidas na preocupação em ministrar o ensino da leitura e escrita obedecendo a marcha natural de aquisição de conhecimento: a marcha analítica. Sampaio Dória alerta para a idéia de que

Si a humanidade, antes de lidar com as concepções abstratas, teve de se avir com os factos concretos; si ainda hoje, não é por outra maneira que se pode fazer uma inferência scientífica, a educação da criança ha de começar pelos factos concretos para ir ter ás abstracções mais a mais dos objectos sensíveis. Do concreto para o abstracto - eis o traçado  (Dória, 1914, p.93).

Para seguir então, a marcha analítica - do concreto para o abstrato, do simples para o complexo, do todo para as partes - o ensino de leitura e escrita deve ser iniciado não diretamente por um sentença ou palavra, mas, pela observação do objeto que, uma vez conhecido através dos sentidos, é tema para a elaboração das sentenças.

A formação do espirito exige a cultura dos sentidos, como base de uma bôa memória; esta, como condição para as associações misteriósas da imaginação e do raciocício, e da capacidade de expressão, tudo mediante exercícios convenientes de observação, de reflexão, de falar e escrever. O cultivo dos sentidos, da razão e da palavra são os tres mais altos cimos de toda educação verdadeira. E como a razão se exerce sobre os dados dos sentidos, e porque a palavra aparece para fixar e significar as percepções dos sentidos, a primazia, na formação do espirito,cabe toda á cultura dos sentidos (Dória, 1914, p.69).

Na edição de dezembro de 1913, ano XII, nº3, é apresentado o artigo Em Classe e para a Classe assinado por Ramon Roca Dordal. Neste, o autor trata da uniformização do ensino da caligrafia, bem como diferencia o ensino da caligrafia do ensino da escrita.


Apresentar aos alumnos um só typo de calligraphia, uma imagem, a mais simples, fácil e perfeita, livre de uns tantos exageros e incovenientes, eis o caminho a seguir.
Calligraphia - é o curso methodico e regular com o fim de que o alumno obtenha a aptidão e o desenvolvimento necessario para escrever com facilidade uma letra uniforme, elegante e clara.
Escripta - é o trabalho que o alumno realiza desde o primeiro dia escolar, ou mesmo antes de entrar na escola, e pelo qual, conforme elle pode, por imitação, trata de adquirir o meio de reproduzir o que lê ou de patentear o que ouve ou pensa.
Deve haver, portanto differença entre o ensino da escripta e o da calligraphia.
A escripta ha de começar no primeiro dia de aula, acompanhando o ensino da leitura.
O ensino da calligraphia começará na escola logo que for possivel, logo que o alumno começar a ler, e isto, methodico, graduado, constituindo uma disciplina aparte.(...)
O ensino da calligraphia ha de abranger:
1º Ensino de letra corrente (typo vertical por ser mais simples).
2º Exercicio de calligraphia elegante e facil (typo individual).
3º Exercicios de letra de phantasia (ronde, gothico, etc.)  (Dordal, 1913, p.16).

E voltando com a preocupação em esclarecer a maneira adequada de “processuar” o método analítico, Mariano de Oliveira, Ramon Roca Dordal e Arnaldo Barreto, assinam o artigo Instrucções práticas para o ensino da leitura pelo Méthodo Analytico de março de 1914, ano XII, nº4. Segue abaixo a reprodução integral das lições sugeridas neste artigo para que o leitor possa, com maior exatidão, apreciá-las.

1º Passo
Provocar, em palestras, a observação dos alumnos sobre um objecto ou estampa qualquer, levando-os a enunciarem sentenças (cinco ou seis, nas primeiras lições) relacionadas umas com as outras, de modo que o objecto lógico de uma seja empregado como sujeito da sentença immediata, formando o todo uma pequena historia descriptiva do objecto ou estampa que sirva de assumpto da lição  (Oliveira et alii, 1914, p.13).











Figura 2.15
Modelo de Lição para aplicação do Método Analítico
                Fonte: Revista de Ensino, edição de março de 1914, ano XII, nº 4.






                                           Figura 2.16
            Modelo de Lição para aplicação do Método Analítico
      Fonte: Revista de Ensino, edição de março de 1914, ano XII, nº 4.


                                                Figura 2.17
                   Modelo de Lição para aplicação do Método Analítico
     Fonte: Revista de Ensino, edição de março de 1914, ano XII, nº 4.



                                              Figura 2.18
                  Modelo de Lição para aplicação do Método Analítico
                          Fonte: Revista de Ensino, edição de março de 1914, ano XII, nº 4.

                                                 Figura 2.19
                  Modelo de Lição para aplicação do Método Analítico
                           Fonte: Revista de Ensino, edição de março de 1914, ano XII, nº 4.




                                            Figura 2.20
                  Modelo de Lição para aplicação do Método Analítico
                          Fonte: Revista de Ensino, edição de março de 1914, ano XII, nº 4.


                                             Figura 2.21
                  Modelo de Lição para aplicação do Método Analítico
                             Fonte: Revista de Ensino, edição de março de 1914, ano XII, nº 4.



                                              Figura 2.22
                  Modelo de Lição para aplicação do Método Analítico
                            Fonte: Revista de Ensino, edição de março de 1914, ano XII, nº 4.



Se nos primeiros artigos publicados pela Revista de Ensino, Ramon Roca Dordal diverge de Kopke na forma de “processuar” o método analítico, com este artigo evidencia-se o seu convencimento de que através de uma estampa qualquer, os alunos devam ser estimulados a enunciarem sentenças, a partir das quais seja possível compor uma historieta e que por meio destas sentenças sejam ensinadas a leitura e a escrita.
Além disso, é possível verificar que estas lições apresentam passo-a-passo como deve ser aplicado o método analítico pela sentenciação. O 1º passo das lições constitui um exaustivo exercício de observação da estampa apresentada, conforme orienta os exercícios por meio de lições de coisas. A observação da estampa é estimulada por perguntas proferidas pelo professor, que a partir das respostas conseguidas dos alunos, vai compondo a historieta.
Com o 2º passo, o professor encaminha a análise da sentença fazendo com que seus alunos percebam que a mesma é composta por palavras. Os alunos, com as palavras destacadas, são estimulados a formarem novas sentenças. No 3º passo, o professor encaminha a análise das palavras em sílabas e promove o conhecimento de várias outras palavras começadas com a sílaba em estudo. Com o 4º passo, os alunos, já conhecendo um número considerável de sílabas, são encorajados a formarem outras palavras e com estas, outras sentenças. No 5º passo, o professor encaminha a análise das sílabas em letras.
Com este artigo, Oliveira, Dordal e Barreto apresentam como deve ser o ensino da leitura e escrita pelo método analítico da sentenciação, desta vez com um exemplo detalhado e prático. Provavelmente, estão empenhados em esclarecer possíveis dúvidas.
E preocupado também com um ensino moral e cívico, Oscar Leme Brizolla, acrescenta com seu artigo Pedagogia Prática - Pelo ensino de junho de 1916, ano XV, nº1 que o professor esforçado deve ensinar seus alunos a não rabiscarem, nem tão pouco sujarem seus cadernos, pois este comportamento retrata falta de educação e de patriotismo. Nesse sentido, deve o professor, ensinar seus alunos a escrever sentenças morais e de higiene, condensando princípios  de moral e civismo.

O professor esforçado escreverá no quadro-negro para occasiões opportunas, phrases suggestivas, como estas;
Quem raspa os cadernos, dá máu indicio da sua educação.
Quem suja os cadernos, dá máu indicio de seu asseio.
O caderno é o espelho em que se reflecte a educação do alumno (Brisolla, 1916, p.24).


Segundo Brisolla, as classes do 1º ano devem ter o seguinte programa:

Secção A - Cada alumno deverá ter o seu nome numa tira de papel, collada em papelão, em bôa letra vertical, para cópias diarias;
Secção B -  A mesma observação, caso não saibam ainda escrever os nomes os alumnos desta secção;
Cópias de sentenças, dando-se preferencia ás já estudadas na aula de leitura analytica, tendo o professor o cuidado de não dar palavras ou sentenças muito cumpridas;
Secção C -  Copias de sentenças estudadas anteriormente; sentenças moraes ou de hygiene; cópias de pequenos trechos do livro de leitura.
O cabeçalho é indispensável, para que o alumno escreva cada vez melhor o seu nome (Brisolla, 1916, p.24 e 25).
O artigo de Brisolla, reafirma que o ensino moral deve ser ministrado pelo ensino da leitura e escrita. Entretanto, apresenta uma idéia que é fundamental para o entendimento de mais um argumento para a escolha oficial do método analítico, além da  importância das contribuições da Psicologia para a sustentação da superioridade do método analítico, posto que está em conformidade com a marcha natural de aquisição de conhecimento da mente humana.
Com seu artigo, Brizolla acrescenta um argumento fundamental que relaciona a oficialização do método analítico para o ensino da leitura aos propósitos de formação do cidadão para a constituição da República recém-proclamada. Pelo método analítico é possível, além de estar em compatibilidade com a marcha natural de aquisição de conhecimento, transmitir, já no processo de ensino da leitura e escrita, um conteúdo cívico e moral, uma vez que pelo método analítico o ensino da leitura e escrita é iniciado pelo estudo da sentença. Conforme Brizolla, essa sentença já deve orientar o aluno aprendiz para um comportamento moral e cívico.
Nesse mesmo sentido, a edição de março de 1917, ano XV, nº4 publica o artigo Educação Moral, que por sua vez, é extraído do relatório do inspetor escolar Guilherme Kuhlmann. Neste, o autor também apresenta a preocupação em orientar os professores, a respeito de uma educação moral. Kuhlmann afirma que ao estabelecer um determinado tipo de orientação aos professores procura  “...dar uma feição que [esteja] de accôrdo com os principios constitucionaes da Republica” (Kuhlmann, 1917, p.6). Segundo o autor, os professores devem ter constantemente as seguintes preocupações:

1) Despertar e fortalecer os sentimentos generosos, pelo exemplo, pelo estímulo.
2) Reprimir as inclinações perigosas, pelo exemplo, pela disciplina.
3) Cultivar a consciencia da criança, pelo exemplo, pela idéa de responsabilidade
4) Formar habitos de conducta moral, pelo exemplo, pelo exercicio (Kuhlmann, 1917, p.6).

Kuhlmann, aponta princípios que devem ser considerados:


1)Deveres para comsigo mesmo.
2)Deveres para com os paes, os irmãos e os demais parentes; deveres para com os professores e os collegas.
3)Deveres para com a Pátria.
4)Deveres sociaes para com os velhos e superiores, para com os iguaes, para com os pequenos e inferiores.
Complemento: Submissão digna e cumprimento do dever; principios de disciplina; distincção entre submissão digna e servilismo e entre altivez e insubordinação. Culto aos mortos, á natureza, á Bandeira  (Kuhlmann, 1917, p.6).

Além disso, o autor apresenta, também, os meios pelos quais a educação moral deve ser ministrada:

a) Contos moraes, conversações, leituras, referencias a historietas, narrações, descripções de scenas moraes feitas pelo professor e pelos proprios alumnos.
b) Casos praticos de asseio, ordem, pontualidade, obediencia, gratidão, veracidade, sinceridade, urbanidade, justiça, bondade e bôa conducta em diversos logares e circumstancias.
c) Scenas reaes ou imaginarias illustradas sobre crianças serviçaes,  bom trato de animaes, respeito á propriedade, altruísmo, amor filial, cooperação ,ordem, economia, respeito ás leis, respeito á Bandeira, considerada principalmente como symbolo da paz.
d) Feitos historicos de facil comprehensão, feitos de heroismo, de elevação patriotica e de nobreza, tirados da historia da humanidade, da patria, do estado e do municipio.
e) Vida de homens celebres, mulheres superiores e precocidades notaveis.
f) Fabulas, poesias e maximas moraes e patrioticas e sua explicação (Kuhlmann, 1917, p. 7).

Por fim , o autor explicita quais os fins a serem atingidos:

1) Habitos de asseio, ordem, obediencia, desinteresse, generosidade, veracidade, lealdade, pontualidade, exactidão, regularidade, deligencia, perseverança, previsão, cortezia, piedade em geral, e para com os animaes; perdão, caridade, justiça, respeito á propriedade, respeito aos superiores, submissão á auctoridade e as leis, respeito á dor alheia, tolerancia ás crenças religiosas, coragem, prudencia, gratidão, energia, calma, cooperação e bondade.
2) Coherencia entre as acções e a consciencia.
3) Sentimentos da dignidade humana, da honra e do dever.
4) Dominio de si proprio pela libertação das paixões egoisticas.
5) Firmeza de caracter (Kuhlmann, 1917, p.7).

Com efeito, a superioridade do método analítico justifica-se, então, pela combinação entre as contribuições trazidas da ciência psicológica: o método analítico é compatível com a marcha natural de aquisição de conhecimento da mente humana e atende aos propósitos de formação da nação republicana, transmitidos através de um conteúdo moral e cívico veiculado pelas sentenças.
Ainda com o propósito de divulgar a maneira correta de ensinar a leitura e escrita pelo método analítico, a edição de junho e setembro de 1917, ano XVI, nº1 e 2 publica o artigo Methodo analytico para o ensino da leitura a principiantes assinado por B. M. Tolosa. Neste, o autor expõe quatro fases de “processuação” do método analítico. Inicialmente, apresenta a 1ª e a 2ª fase, pelas quais, é ensinado o significado da sentença bem como as palavras que a compõe, 

 1ª phase - A Sentença
Esta primeira phase, convenientemente praticada, prepara o espirito do alumno para a analyse do seu proprio pensamento escripto.
Esta analyse conduz o alumno ao conhecimento das partes da sentença, leva-o também a dominar muitas palavras. E o conhecimento dessas muitas palavras escriptas marca a passagem para a segunda phase da aprendizagem da leitura.(...)
2ª phase - A Palavra
No nosso entender esta é a phase que inicia realmente o aprendiz na arte da leitura.(...) O objectivo da 2ª phase é levar a criança por meio das palavras que lhe são já familiares ao conhecimento de todas as outras palavras da lingua.(...) Uma vez isoladas as palavras, para objecto de estudos, estas serão apresentadas variando em suas flexões de genero, numero, grau de significação, formas comparativas e flexões verbaes. A analogia poderá fornecer diversas outras palavras, levará ao conhecimento de familias de palavras.Vocabulos similhantes pelo começo, pelo fim , pelo meio; o conhecimento dos numero monossylabos da linguagem commum preparam as crianças para a analyse das palavras e sua decomposição em sylabas, bem como para a construcção e composição de novos termos  (Tolosa, 1917, pp.17-23).


A 3ª e a 4ª fase cuidam de encaminhar a análise das palavras ao ponto da letra.

3ª phase - A Sylaba
A distincção das sylabas, neste ponto já não offerece nenhuma difficuldade, pois o professor, quando escreve a palavra, naturalmente a pronuncia vagarosamente, carregando em cada sylaba a proporção que a escreve. (...)
O estudo das sylabas prepara a 4ª fase - a letra - que deve ser praticada já no 2º anno, nos exercicios de linguagem que sempre acompanham as licções de leitura (Tolosa, 1917, p.23).

Este artigo de Tolosa, reafirma as orientações dadas pelo artigo Instrucções práticas para o ensino da leitura pelo Méthodo Analytico, de março de 1914, ano XII, nº4 assinado por Mariano de Oliveira, Ramon Roca Dordal e Arnaldo Barreto. Primeiro a sentença, depois a palavra, a sílaba e a letra.
A edição de junho a dezembro de 1918, ano XVIII, nº1 a 4 encerra as publicações da Revista. Apresenta os quatro últimos artigos sobre o ensino da leitura e da escrita. B. M. Tolosa retorna assinando os dois primeiros artigos,  Pedagogia - O Ensino da Leitura pelo Methodo Analytico e Ensino da Leitura pelo Methodo Analytico. O terceiro e o quarto são assinados por Raphael Cavalheiro O Ensino Natural da Leitura e A intuição analytica no ensino da leitura.
Estes artigos são escritos com um propósito claro: justificar o insucesso da aplicação do método analítico para o ensino da leitura e escrita. No primeiro, Tolosa argumenta:

Procurando a razão dos resultados mediocres alcançados pela decomposição forçada da sentença em palavras e dos vocabulos em syllabas, descobrimo-la no processo com que o alumno aprende, reconhece e domina umas e outras.(...)
Em 1917 diziamos: “Nesta phase, a da sentença, não ha necessidade de dominar a sentença pois o objectivo actual não é a leitura da sentença, e o objectivo futuro é aprender a ler, e isto se consegue lendo palavras. A leitura das palavras vem naturalmente com a leitura de muitas e variadas sentenças, produzidas pela propria classe.”(...) A experiencia confirma, pois que a sentença serve apenas como meio de a criança aprender e reconhecer palavras, ou (...) serve apenas de vehiculo da palavra (Tolosa, 1918, p.35).

No segundo, o autor, apresenta as fases de aplicação do método analítico prevenindo os professores que se ocupassem com cuidado da primeira fase: a da sentença. Baseado nas afirmações do primeiro artigo, Tolosa afirma:

Para facilidade da processuação do ensino da leitura ás crianças analphabetas, convém dividir o trabalho em quatro phases: - 1ª phase: Da sentença; - 2ª phase: Da palavração; - 3ª phase - Da sylabação; - 4ª phase - Da deletração. (...)
[Na fase da sentença] ha um escolho que aliena muitas vezes a sympatia das crianças aos exercicios de leitura: é a sentença completa. Realmente a sentença que tem de ir para o quadro-negro deve ser uma sentença completa, com todas as suas palavras visiveis.(...)
[ Porém ] Não deve ser preocupação que toda a classe aprenda todas as palavras da sentença. Sendo a sentença simples vehiculo da palavra, esta é que precisa ser dominada e não a sentença... (Tolosa, 1918, p.157 e 158). 

Tolosa, com seus dois artigos chama a atenção para o caráter que deve ter a sentença, no ensino de leitura e escrita. Ela é apenas o veículo que confere significado às palavras, as quais, estas sim, devem ser aprendidas.
O terceiro artigo O Ensino Natural da Leitura, assinado por Raphael Cavalheiro, também preocupado com a aplicação do método analítico, principalmente na primeira fase - da sentença - fundamenta os argumentos de Tolosa. O autor, inicialmente afirma que o método adequado para o ensino da leitura é o método analítico.

A efficacia do ensino é uma questão de methodo - e, si assim é, nada mais logico de que, para bem ensinarmos a ler, devemos procurar, o methodo proprio. É bem de proposito que eu me refiro a este ponto, porque, si o methodo é um meio idoneo de que lançamos mão para um fim determinado, o ensino de leitura requer essa condição, que, não sendo satisfeita, será a sua completa falibilidade.(...)
A propria natureza nos mostra que o methodo proprio para o ensino de leitura é a intuição analytica - e, de facto, quando uma criança nasce, a sua massa cerebral - que é o germen ou o condensamento de toda a sua actividade futura - não possue a menor ou imperceptivel sombra de impressões; dessa hora em diante é que, pelas sensações que receber do mundo interno e externo, principiará ella a fazer segura e intelligente provisão para o futuro (Cavalheiro, 1918, p.37 e 38).


Além disso, chama a atenção para a importância de iniciar o ensino da leitura e escrita pelo estudo da sentença que é a unidade de pensamento. Nas palavras do autor, seria um erro iniciar o ensino pelo método de palavração.

A natureza, entretanto, mostrava implicitamente que a criança só adquiria noções por intermedio de pensamentos: só o que é claro é que a mesma comprehende- e é por isso que quando queremos ensinar o nosso methodo, temos de partir do todo.
Ora, todo é uma palavra equivoca e que si não for precisada poderá levar-nos a um emaranhado tal, do qual não teremos sahida. (...)
[ A sentença ] é um todo porque exprime um pensamento que pode ser analysado em partes concretas, mas aquella não o é, porque os seus elementos são abstracções das quaes o espirito só toma conhecimento pelas leis da analyse. Erraria, pois, imperdoavelmente, quem quizesse ensinar a lêr começando por palavras, isto é, pela palavração.(...)
O todo, pois, no ensino de leitura é a sentença, a unidade de pensamento(...)
Em torno deste ponto é que está o pivot capital da questão do ensino de leitura; entendem, porém, que fornecidas (...)  - as sentenças - as crianças deveriam dominal-as (...) e em consequencia immediata - le-las.(...)
A sentença - o todo - a unidade de pensamento, na expressão de Binet - é apenas um vehiculo. (Cavalheiro, 1918, p.39 e 40).

Com o quarto e último artigo A intuição analytica no ensino da leitura, Cavalheiro, reafirma as considerações feitas em seu artigo anterior, bem como aquelas dos dois artigos de Tolosa, todos publicados na mesma edição. O autor afirma que:

Tem sido mui desviada a marcha até agora seguida pelos professores no ensino de leitura aos analphabetos.
Parece-me que a culpa não cabe a ninguem, todos com maior ou menor resultado, procuraram acertar e cumprir as determinações. O caminho, porém, seguido, tem sido nosso maior impecilho.
Folgamos, agora em ter conseguido achar o trilho seguro, certo e natural. Elle será daqui por diante o nosso pharol.
Oxalá possamos conseguir o que até agora tem sido um sonho ou um problema, e dar-nos-hemos por satisfeitos.(...)
Até agora queriamos que a criança começasse a aprendizagem da leitura lendo sentenças e com aggravante de fazermos questão que ella dominasse perfeitamente as sentenças das primeira lições.
Assim praticavamos porque, diziamos nós, foi essa a marcha natural pela qual a criança aprendeu a falar. Ha nesta affirmação um engano que, passando despercebido, concorreu para a inefficacia do methodo analytico, hoje quasi que sem adeptos, devido ao facto.
O engano consiste, a meu ver, no seguinte:
A sentença é apenas um vehiculo neste ensino, como a agua ou o xarope e os vinhos o são de medicamentos que queremos fornecer ao nosso corpo. É por intermedio della que nós introduzimos no cerebro das crianças – palavras  (Cavalheiro, 1918, p.180).

Os artigos de Tolosa e de Cavalheiro revelam a preocupação com o insucesso da aplicação do método analítico. Segundo os autores, o insucesso deve-se a não compreensão de que a sentença é apenas um veículo transmissor de sentido para o aprendiz que, por sua vez, deve voltar as suas atenções para a aprendizagem da palavra.
Mais que isso, os profissionais encarregados de ensinar a leitura e a escrita não compreendem que o ensino iniciado pela sentença permite transmitir a educação moral e cívica republicana, tão necessária à constituição do novo regime. O ensino iniciado pela sentença permite a formação do cidadão republicano leitor.
O método analítico para o ensino da leitura torna-se oficial em 1911, por determinação de Oscar Thompson, Diretor Geral da Instrução Pública de São Paulo. Certamente, os motivos que levam a determinação oficial não são de pouca importância. À República recém-proclamada coloca-se um desafio: constituir de fato o regime republicano. E formar cidadãos leitores é o caminho para viabilizar o novo regime. A formação dos cidadãos leitores, tão necessários à República, deve, por sua vez, estar em sintonia com as novas descobertas da ciência psicológica e ao mesmo tempo servir de transmissora dos ideais republicanos. E o método analítico é o único capaz de atender a todas essas exigências.
Mas, se de um lado, a oficialidade do método analítico não garante o sucesso de sua aplicação, é o que revelam os artigos publicados pela Revista de Ensino, quando indicam problemas no modo de operá-lo, de outro, não se pode negar a existência de um esforço em divulgar as bases sustentadoras de sua superioridade, bem como, o modo correto de sua “processuação”, é o que revelam também, os artigos da Revista.
Contudo, verifica-se que este esforço é insuficiente a ponto de o método analítico deixar de ser oficial com a publicação da Lei 1750 de 08 de dezembro de 1920, que no artigo 13º institui a “...máxima autonomia didactica, compativel com a unidade e efficiencia do ensino” (Cf. Coleção de Leis e Decretos...
Com os artigos da Revista de Ensino é possível identificar os argumentos que justificam a oficialização do método analítico para o ensino da leitura bem como os motivos que provocam a publicação da Lei 1750 de 08 de dezembro de 1920, que institui a autonomia didática aos professores. Para formar o cidadão republicano é preciso, além de torná-lo leitor, educá-lo para viver na nova nação. E o único método capaz de encaminhar este tipo de formação, é o método analítico. Todavia, a oficialidade do método analítico não pode garantir o sucesso de sua aplicação.
No ensino de leitura e escrita pelo método analítico é depositada a função de produzir o cidadão republicano.  O processo de produção das idéias de que a República necessita de cidadãos leitores para constituir-se como regime, que o ensino da leitura e escrita deve formar o cidadão republicano com um certo corpo de condutas, bem como que o método de ensino capaz de produzir o cidadão republicano é o método analítico para o ensino da leitura, é o assunto com o qual nos ocuparemos a seguir.  






Capítulo III

O imaginário republicano e o ensino da leitura e escrita







A produção da idéia de que a República, para constituir-se como regime, necessita de cidadãos leitores, não é apenas observada no caso brasileiro. Na França revolucionária do século XVIII, depositava-se na instrução a expectativa de edificar a nova sociedade, rumo ao progresso e à modernidade. À educação francesa era conferido o lugar de condutora das reformas sociais, as quais seriam viabilizadas através da constituição de uma nação pedagogicamente reformada. 
O surgimento das bibliotecas a partir de 1790, certamente é um dos mais importantes exemplos de como a instrução conta no processo de constituição do regime republicano francês. Com elas, surge também a leitura pública na França. Os acervos dessas bibliotecas, que antes da Revolução são propriedades privadas de pessoas ou instituições, são colocados à disposição da nação e são constituídos de livros educativos e instrutivos (Cf. Chartier e Hèbrard, 1995, p.117). Mais tarde, já no século XIX, organizadas como bibliotecas populares, universitárias e escolares ampliam o público leitor, cumprindo o objetivo republicano de educar o povo, tão necessário ao novo regime. Nas palavras de Chartier e Hèbrard:

...aos olhos dos republicanos, que as recebem como herança, como aos do Segundo Império liberal, que as criou, as bibliotecas escolares são bastiães avançados de laicização pelo livro e também dispositivos de educação e moralização do povo  (Chartier & Hèbrard, 1995, p.128).

Moralizar o povo para constituir, então, a nação republicana. Evidencia-se, assim, a necessidade de não apenas instruir, mas sobretudo educar. E um projeto de homem novo, regenerado deve ser arquitetado para o sucesso do novo regime.

Surge com a Revolução, a utopia da regeneração dos tempos pela eliminação dos vestígios arcaicos do Antigo Regime e pela representação do homem novo a ser preparado pela escola. (...) A pedagogia torna-se conectada à esfera pública e ao próprio civismo: educação pela tessitura das almas revolucionárias que engendrariam a nova forma de ser nação (Boto, 1996, p.69).

Engendrar, então, a formação de um homem novo, com novos valores, moderno, urbano e leitor torna-se condição imprescindível para a constituição da nação republicana francesa. Chartier e Hèbrard  apresentam argumentos de época a respeito da importância das “boas leituras” para a formação de uma nova conduta:

Os bons livros nos afastam do cabaré, nos instruem sobre nossos deveres de filho, de irmão, de esposo e de pai; mostram-nos as obrigações que temos para com os homens e com a pátria. Os bons livros elevam nossa alma até Aquele da qual ela descende; nos dão um coração, sentimentos generosos. Os bons livros conquistam os povos para a liberdade, arrancando-os da escravidão e difundindo por todas as partes os benefícios da civilização, o amor pelas letras, pelas ciências e pelas artes  (Rougier apud Chartier & Hèbrard, 1995, p.130).


No caso brasileiro, não é diferente, posto que a República no Brasil é depositária de equivalentes ideais de constituição de nação, verificados no caso francês. Com o exame da literatura especializada, à época da proclamação da República brasileira, verifica-se que para a viabilização do novo regime é preciso formar não apenas leitores, mas sobretudo cidadãos leitores, com uma certa moralidade, uma certa mentalidade, um certo corpo de condutas compatíveis com a vida republicana. Mais que letrado, o novo homem deve estar preparado para a nova sociedade científica, moderna, urbana e industrial em construção, sendo necessário, então, abandonar os velhos valores da sociedade escravista, arcaica e agrária. À educação, neste contexto, é destinado o lugar de produtora  e protetora do novo regime.
Entretanto, se é a educação a responsável por formar o novo cidadão leitor, não pode fazê-lo de qualquer forma. É preciso escolher a melhor maneira, o melhor método, capaz de produzir o melhor cidadão republicano. O debate registrado nos artigos da Revista de Ensino revela divergências no modo de encaminhar a formação republicana através do ensino da leitura e escrita. Defensores do método analítico e defensores do método sintético disputam a preferência dos legisladores e educadores do começo do século, munidos de cientificidade e determinados em eleger o melhor método de ensino da leitura e escrita, capaz de formar adequadamente o cidadão republicano.
Em São Paulo, a escolha oficial recai sobre o método analítico, por considerá-lo o único capaz de encaminhar a formação republicana; primeiro, porque é compatível com o processo de aquisição de conhecimento pela mente humana, conforme a ciência psicológica disponível, e segundo, por possibilitar a difusão de um conteúdo moral e cívico, uma vez que inicia o ensino da leitura e escrita por meio de sentenças imbuídas de significados morais e cívicos.
O debate sobre os métodos de ensino da leitura e escrita sugere uma certa correlação com a disputa entre projetos diferençados de construção da República recém- proclamada, que precisa ser compreendida. Entender como se produziram as idéias de que ensinar os cidadãos a ler e escrever é uma condição fundamental para a viabilização do regime republicano; que este ensino deve visar a formação de uma certa mentalidade, uma certa moralidade, um certo corpo de condutas compatíveis com a vida republicana e, ainda, que, por sua vez, não pode ser qualquer ensino, mas orientado pelo método analítico, implica no conhecimento das bases de sustentação das disputas tanto metodológicas quanto ideológicas.
Para recompor este processo, torna-se necessário examinar com atenção quais são os projetos diferençados de construção da República no processo de instauração do novo regime.
Segundo José Murilo de Carvalho, no Brasil pós-proclamação, pelo menos três concepções disputam a definição da natureza de República a ser implementada: o jacobinismo, o liberalismo, e o positivismo. No jacobinismo a democracia é exercida pela participação direta de todos os cidadãos. No liberalismo, a sociedade é composta por indivíduos autônomos, cujos interesses são compatibilizados pela mão invisível do mercado. O governo deve interferir o menos possível na vida dos cidadãos. Já o positivismo oferece outra saída. Condenando em nome do progresso, pois, pela lei dos três estados, corresponde a fase teológico-militar, a Monarquia deve ser superada pela fase positiva, cuja melhor versão é a República. A ditadura republicana exige um executivo forte e intervencionista, o progresso pela ação do Estado e pela incorporação do proletariado à sociedade moderna (Cf. Carvalho, 1990, p.9 e 27).
Apesar de o debate entre esses projetos ter sido intenso no início da República, na virada do século, o projeto liberal coloca-se à frente da República brasileira.
As disputas entre as diferentes concepções ideológicas de constituição do novo regime revelam, em verdade, uma disputa entre concepções diferençadas a respeito de quais elementos devem constituir o imaginário republicano brasileiro. Para Carvalho, a disputa entre os diferentes projetos de República,

Tratava-se de uma batalha em torno da imagem do novo regime, cuja finalidade era atingir o imaginário popular para recriá-lo dentro dos valores republicanos.(...) A elaboração de um imaginário é parte integrante da legitimação de qualquer regime político. É por meio do imaginário que se podem atingir não só a cabeça mas, de modo especial, o coração, isto é, as aspirações, os medos e as     esperanças de um povo.   É nele que as sociedades definem suas identidades e objetivos, definem  seus inimigos, organizam seu passado, presente e futuro  (Carvalho, 1990, p. 10).

Ideais de modernidade, cientificidade, urbanidade devem ser imprimidos no imaginário popular, substituindo velhos valores e possibilitando, assim, uma vida compatível com as exigências da República recém-proclamada.
Ainda, segundo Carvalho, são os positivistas ortodoxos os que mais investem na constituição de um imaginário republicano e ainda o fazem por meio da palavra escrita e por símbolos cívicos.
A concepção positivista, na instauração do regime republicano brasileiro, representada por Benjamim Constant, postula que a democracia representativa  característica do estado metafísico da humanidade deve ser superada e em seu lugar ser instaurada a ditadura republicana, na qual o ditador governa por toda vida e escolhe seu sucessor. Seu objetivo principal é, segundo Carvalho “...promover a república social, isto é, garantir, de um lado, todas as liberdades espirituais e promover, de outro, a incorporação do proletariado à sociedade, mediante a eliminação dos privilégios da burguesia” (Cf. Carvalho, 1990, p.41).
Os positivistas acreditam que o regime republicano deve ampliar os direitos sociais, incorporando os trabalhadores na vida pública brasileira. Essa incorporação deve ocorrer de forma ordenada, e a escola pública deve educar as massas proletárias. E mais que isso, a instrução do povo brasileiro é a garantia da formação do cidadão republicano.
Verifica-se, a partir disso, uma predominância da concepção positivista na produção das idéias de que primeiro: a formação do cidadão leitor é fundamental para a viabilização do novo regime, posta a importância conferida à instrução na formação do cidadão republicano; segundo: de que esta formação deve constituir um corpo de condutas morais e cívicas, as quais devem preparar o cidadão leitor para a vida na sociedade republicana, posto que o culto à pátria e à família, a ordem e o progresso são altamente reverenciados nesta concepção e terceiro: que o método analítico seria o método que melhor encaminharia a formação do cidadão-leitor. Para melhor explicar como a concepção positivista orienta a produção desta terceira idéia é preciso recuperar as conclusões que já tecidas a respeito.
Verifica-se anteriormente que, a Psicologia fornece a argumentação para demonstrar a superioridade do método analítico no ensino da leitura e escrita. O argumento trazido da ciência psicológica para demonstrar essa superioridade é a compatibilização deste com a marcha natural do espirito humano na aquisição do conhecimento. Paralelamente, verifica-se que, o ensino da leitura e escrita pelo método analítico, viabiliza a transmissão de um conteúdo moral e cívico, fundamental para a formação do cidadão republicano.
Warde informa que o desenvolvimento das teses positivistas desencadeou uma crise na Filosofia. Destaca, por sua vez, duas causas que explicam o fenômeno: a primeira refere-se ao declínio da Filosofia, operado pelo desenvolvimento e autonomização das ciências;  a segunda, refere-se ao futuro da Filosofia, uma vez que as ciências, dela não mais necessitam para construir suas certezas universais e objetivas (Warde, 1990, p27).
Essa crise opera deslocamentos nos domínios da Filosofia. Segundo Warde, a concepção comteana de Ciência, depurada por Durkheim de seus “resíduos metafísicos”, separa de um lado a Ciência e, de outro, a Filosofia e o senso comum (Warde, 1990, p.29). Mais do que isso, o positivismo desautoriza a Filosofia a tratar como questões de seu domínio, as relacionadas com o conhecimento. À Filosofia é suprimido

... o direito (...) de legislar e exercer jurisdição sobre as questões do conhecimento, tal como vinha fazendo através da Teoria do Conhecimento, para postular em seu lugar a Epistemologia como Teoria da Ciência (exposição sistemática e normativa dos procedimentos da investigação científica), [além disso a Psicologia deveria] se constituir em ciência herdeira de temas Gnoseologia (Teoria do Conhecimento), bem como dos temas sobre o humano individualmente considerado, já que os relativos ao coletivo haviam sido entregues à sociologia  (Warde, 1990, p.29).

Sendo assim, o positivismo dá sustento ao deslocamento de temas da Filosofia para a Psicologia. Ainda segundo Warde, nos domínios da Psicologia

Questões morais deveriam ser investigadas como expressões da atividade e do comportamento dos indivíduos e deveriam subordinar-se ao controle de técnicas psicológicas. Interrogações sobre o conhecimento em geral e as condições de possibilidade de o Sujeito Cognoscente alcançar a objetividade e a universalidade, que constituíam apreensões basilares da Teoria do Conhecimento tal como ela foi modernamente instituída pela Filosofia, deveriam ser substituídas pelas investigações empíricas sobre os mecanismos nervosos e deveriam redundar em respostas sobre eventos observados, cuja regularidade e repetição essas sim, descreveriam o Sujeito que conhece e seus atos cognoscitivos, no limite positivo dos seus estados físicos e fisiológicos (Warde, 1990, p.29).

Assim, observa-se que o positivismo é fortemente responsável pela delimitação das fronteiras da Psicologia como campo científico autônomo. Com a transferência de temas antes cuidados pela Filosofia, à Psicologia é destinado, além dos assuntos referentes ao humano individual, também os referentes a moralidade, portanto, à vida coletiva.
Assim, talvez seja possível enxergar uma relação entre os domínios que estão sendo determinados para o campo da ciência psicológica e o grau de sua intervenção na sustentação da idéia da superioridade do método analítico para o ensino da leitura. Tavares pode contribuir, quando afirma que

Para o ensino da Psicologia Experimental, caberia a tarefa de esclarecer as bases científicas em que se assentam os novos métodos pedagógicos, a fim de possibilitar que o“ mestre versado na moderna psico-pedagogia” pudesse fazer “verdadeiros milagres com seus alunos”(Thompson,1917:28) (Tavares, 1996, p.136).   

Com Tavares, reafirma-se a idéia de que a Psicologia está orientando de fato quais devem ser os procedimentos adequados para o ensino republicano.
Se anteriormente, constatou-se que as informações trazidas da ciência psicológica sustenta a superioridade do método analítico para o ensino da leitura e escrita, posto que este é compatível com a marcha natural de aquisição de conhecimento da mente humana, é possível também verificar que a Psicologia pode ter informado a respeito de como imprimir uma moralidade na formação do cidadão republicano, posto que “questões morais deveriam ser investigadas como expressões da atividade e do comportamento dos indivíduos e deveriam subordinar-se ao controle de técnicas psicológicas (Warde, 1990, p.29).
Carvalho, referindo-se ao processo de instalação, em 1914, do Laboratório de Pedagogia Experimental, no Gabinete de Psicologia e Antropologia Pedagógica, anexo à Escola Normal Secundária de São Paulo, informa a respeito de uma Carteira Biográfica Escolar[19], cujo objetivo era reunir informações sobre o caráter específico de cada aluno. Nas palavras da autora,

... a Carteira Biográfica deve se pensada como dispositivo de produção de um conhecimento sobre o aluno. Mais do que isso, como dispositivo de constituição da criança enquanto aluno, dispositivo de produção da individualidade na confluência das medidas e dos ‘dados’ de observação constituídos como índices de normalidade, anormalidade ou degenerescência. Compleição Física, tipo racial, traços morais, marcas de hereditariedade, ambiente familiar constituíam um roteiro de observação e medida e forneciam as tópicas de registro na Carteira Biográfica Escolar. No cruzamento dessas medidas e observações é que ganhava contorno o caráter específico do aluno (Carvalho, 1997, p.273)

Ainda, segundo Carvalho

Entre os saberes de cuja confluência emergia o conhecimento da criança, era a psicologia que, segundo Thompson, tinha primazia, fornecendo “à ciência da educação dois capítulos de suma importância: a psicognóstica e a pedotécnica”. A primeira, estudando “o caráter específico da criança nas várias fases da vida segundo o tipo normal e anormal”;  a segunda, estabelecendo “as normas traçadas ao método e a didática para o ensino se pôr em harmonia com a natureza psicológica do escolar (Carvalho, 1997, pp. 273 e 274).    

Conforme as considerações de Carvalho, a Psicologia fornece fundamentalmente, os conhecimentos a respeito do caráter psicológico e moral do aluno, bem como a respeito de como deve ser um ensino compatível com a sua natureza psicológica, de modo a operar as necessárias transformações na vida do índividuo e  prepará-lo para viver na nova nação. “Observar, medir, classificar, prevenir, corrigir.” (Carvalho, 1997, p.278) Esses eram os processos utilizados na produção do novo cidadão.  
Entender que a Psicologia sustenta a superioridade do método analítico para o ensino da leitura e escrita pelas seguintes razões: primeiro, por informar que o método analítico é compatível com a marcha natural de aquisição de conhecimento da mente humana; e segundo por informar a respeito do modo adequado, também pelo método analítico, de imprimir uma moralidade na formação do cidadão republicano, implica também compreender que essas considerações só podem ser tecidas, perante o entendimento do movimento que o Positivismo opera na delimitação de um novo campo científico, a Psicologia.
Assim, se de um lado, a concepção positivista não é responsável diretamente pela produção da idéia de que somente pelo método analítico é possível encaminhar a melhor formação republicana, de outro, verifica-se sua participação no engendramento do campo científico que, pela produção dessa idéia, responsabiliza-se.
Concordando com Carvalho, o Positivismo é a vertente que mais investe na formação de uma imaginário republicano, e o faz através de uma marcante intervenção aos propósitos que assume a educação, responsável pela produção da nova sociedade. Para formar o cidadão, é necessário mais que instruí-lo, educá-lo, imprimindo-lhe os ideais de uma nova nação, a nação republicana.


Considerações Finais







Embora que, conforme informam os últimos artigos da Revista de Ensino, o método analítico para o ensino da leitura e escrita não obteve sucesso em sua aplicação, não há como negar que o desenvolvimento do debate acerca dos métodos de ensino de leitura e escrita, bem como a exposição do conjunto de argumentos, pelo quais sustenta-se a oficialização do método analítico, como o único método capaz de encaminhar adequadamente a formação republicana, encadeiam um importante enriquecimento acerca dos saberes sobre como ensinar leitura e escrita no período pós proclamação da República no Brasil.
As disputas entre o método analítico de palavração e sentenciação e o método sintético de soletração e silabação revelam grande fôlego de argumentos que justificam as escolhas metodológicas da época. De um lado, a importância de iniciar o ensino de leitura e escrita pela sentença, unidade de pensamento e viabilizadora de sentido, bem como pela palavra, que por sua vez, ao ser destacada da sentença deve encaminhar propriamente o ensino da leitura e escrita; de outro, a importância de iniciar o ensino por meio de letras e sílabas imbuídas de significado, por exemplo as interjeições. Não obstante, em um aspecto, defensores do método analítico e defensores do método sintético concordam: o ensino da leitura deve ser ministrado, garantindo ao aluno, o entendimento daquilo que está por aprender.
Entretanto, com a oficialização do método analítico, o ról de argumentos explicitados não é, comparavelmente, pequeno. Esclarecer os professores do começo do século, acerca das descobertas da ciência psicológica, bem como a respeito da importância de um ensino moral para a formação do cidadão republicano são argumentos exaustivamente expostos pela literatura especializada de época. Estar em concordância com a marcha natural de aquisição de conhecimento da mente humana, bem como viabilizar um conteúdo moral e cívico capaz de formar o cidadão com uma certa mentalidade, uma certa moralidade, um certo corpo de condutas compatíveis com a vida republicana são requisitos atendidos pelo método analítico, pelos quais sustenta-se a sua superioridade.
Com as informações trazidas da Psicologia, o método analítico para o ensino da leitura e escrita ganha foros de oficialidade. Mas as fronteiras da Psicologia, no começo do século, estão sendo delimitadas, por um movimento operado pelo Positivismo, quando conforme Warde (1990), desloca para a Psicologia, temas antes tratados pela Filosofia. 
No projeto positivista de construção da República é possível verificar a produção das teses de que a República necessitava de cidadãos leitores; que pelo ensino da leitura e escrita deveria ser ministrado um conteúdo moral e cívico capaz de preparar o cidadão para viver na sociedade republicana; e ainda que indiretamente, que o único método capaz de formar adequadamente o cidadão republicano é o método analítico, uma vez que deslocando temas antes tratados pela filosofia, o Positivismo confere a Psicologia o estatuto de responsável pela produção de conhecimentos relacionados a vida psíquica e moral do indivíduo.
O conjunto de conhecimentos revelados pela investigação de como foi organizado o ensino de leitura e escrita em São Paulo, no período pós-proclamação da República brasileira - 1890-1920, certamente contribui para a escrita da História da Educação Brasileira, bem como para a escrita da história das práticas de alfabetização no Brasil. Talvez, com ele, seja possível instigar os pesquisadores da educação a assumirem a tarefa de delimitar um campo de pesquisa preocupado com a história das práticas de alfabetização, bem como contribuir com uma visão histórica, para que os professores que se ocupam da tarefa de alfabetizar.



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WARDE,M.J. 1984.  Liberalismo e Educação. Tese de Doutorado, PUC-SP.



[1]A Revista de Ensino publica na edição de março de 1910, ano IX, nº1, parte da conferência realizada por João Kopke no antigo edifício da Escola Normal de São Paulo, sendo que a continuação da conferência não é encontrada em qualquer dos números posteriores da Revista. Apesar de Brito não mencionar a data da realização da conferência, João Kopke o faz em artigo publicado pela Revista de Ensino na edição de outubro, 1902, ano I, nº4. Neste artigo, Kopke responde também, aos argumentos que contrariam seu método, apresentados pelos artigos de Joaquim Brito publicado na edição de abril de 1902, ano I, nº1 e Ramon Roca Dordal publicado na edição de junho de 1902, ano I, nº2.
[2]Conforme Caetano de Campos em carta dirigida a Rangel Pestana à 20 de março de 1890, Miss Marcia Browne, ainda nos Estados Unidos, dirigia uma Escola Normal de senhoras em Saint Louis (Massachusetts) e possuía 250 contos. Vindo para São Paulo, é convidada a auxiliar Caetano de Campos na implantação da reforma na Escola Normal de São Paulo, estabelecida pelo Decreto nº27 de 20 de Março de 1890. Cf. Reis Filho, 1995.

[3]João de Deus é autor da Cartilha Maternal. Conforme Cardoso (1902), João de Deus é escritor português e fundador da “Arte de Leitura”, que aplica o ensino da leitura e escrita partindo da fala e aplicando-a a ortografia.
[4]Conforme Kopke, o compenedor é um aparelho composto por três rodas uma a direita, uma a esquerda e outra no centro. A primeira é constituída pela consoantes iniciais, a segunda pelas consoantes finais e a terceira pelas vogais. Ao mover as rodas, podem os alunos, formar palavras (Kopke, 1903, p.1192).
[5]A Cartilha da Mães é escrita por Arnaldo de Oliveira Barreto e a 49ª edição é publicada em 1938 pela Livraria Francisco Alves. É uma obra aprovada pelo Conselho Superior de Instrução Pública do Estado de São Paulo e adotada em todas as suas escolas e em muitos colégios particulares, conforme informação fornecida em sua página de rosto.
[6]A Cartilha da Infância é escrita por Thomaz Galhardo e a 109ª edição é publicada em 1924 pela Livraria Francisco Alves e modificada e ampliada por Romão Puiggari.
[7]Conforme o Decreto 144 B de 10 de dezembro de 1892, as Escolas Preliminares são aquelas que encontram-se sob regência de professores normalistas (diplomados pela Escola Normal de São Paulo).
[8]Evidentemente as matérias determinadas por este Decreto, referem-se aos quatro anos de duração do curso preliminar. Concentramos nossas atenções nos programas de ensino da leitura e escrita determinados para o 1º ano, composto pela 1ª série, equivalente ao 1º semestre do ano e pela 2ª série, equivalente ao 2º semestre do ano, por identificarmos que é no 1º ano que os programas ocupam-se com o ensino da leitura e escrita propriamente dito.
[9]Para organizar a distribuição das escolas pelas diversas localidades do Estado, a Lei nº169 de 07 de agosto de 1893, autoriza o Conselho Superior da Instrução Pública a fazer funcionar em um só prédio, as escolas preliminares que, em virtude da densidade demográfica, estão funcionando em maior número que o permitido em raio fixado para a obrigatoriedade. Esses prédios são denominados de Grupos Escolares pelo Decreto nº248 de 26 de julho de 1894.
[10]As Escolas-Modelo, são criadas com o Decreto nº27 de 12 de março de 1890, com o intuito de oferecer o ensino preliminar ministrado por alunos do 3º ano da Escola Normal da capital.
[11] Como Diretor Geral da Instrução Pública de São Paulo no período de 1909 à 1911, Oscar Thompson, em relatório dirigido ao Secretário do Interior e publicado pelo Annuario de Ensino do Estado de São Paulo - 1909-1910, determina que o ensino da leitura e da escrita deve ser ministrado pelo método analítico, por ser este o método mais compatível com a marcha natural de aquisição de conhecimento do espírito humano.
[12]Este manual é uma publicação feita pela Diretoria Geral da Instrução Pública no ano de 1912, assinada pelos inspetores escolares Miguel Carneiro, J.Pinto e Silva, Mariano de Oliveira e Theodoro de Moraes, o qual orienta os professores a procederem o ensino da leitura e escrita pelo método analítico. “...A leitura analytica partirá, pois, da sentença como expressão sensível do pensamento. Sentenças curtas, feitas de preferencia pelo alumno, escritas no quadro negro, serão vistas e lidas como um todo. Depois que o alumno se familiarizar e dominar um certo numero de sentenças, lendo-as facilmente por terem ligação lógica, serão ellas decompostas em palavras e estas em phonemas e letras. Assim será o processo do ensino.” (Carneiro et alii, 1912, p.5).
[13]No ano de 1911 são publicadas três edições da Revista de Ensino: junho de 1911, ano X, nº1, setembro de 1911, ano X, nº2 e dezembro de 1911, ano X, nº3. Conforme informa a edição de setembro de 1911, ano X, nº2, em página de rosto, a partir da edição de junho de 1911, ano X. nº1, a Revista de Ensino passa a ser publicada sob os auspícios da Diretoria Geral da Instrução Pública. “Reencetando sua publicação sob os auspícios da Directoria Geral da Instrucção Publica, tendo sido já publicado o primeiro numero desta nova phase, ella  espera continuar a merecer a collaboração de todos quanto se interessem pela nobre causa da instrução popular.” (Revista de Ensino, 1911).
[14]Com o Decreto 2004, de 13 de fevereiro de 1911, estabelece-se que anexas a Escola Normal de São Paulo, devem funcionar duas Escolas-Modelo Isoladas sob sua diretoria, divididas uma para cada sexo, com a finalidade de aperfeicoar os métodos e processos de ensino que devem ser adotados no ensino público preliminar do Estado, e servir para a prática dos alunos da Escola Normal de São Paulo. Este Decreto também determina que o curso dessas escolas deve ser divido em três seções sendo que a primeira corresponde ao ensino da leitura e escrita propriamente dito.
[15] Conforme determinação do Decreto nº 2368 de 14 de abril de 1913, as Escolas de Bairro são Escolas Preliminares situadas em centros agrícolas, povoados ou distritos de paz e são classificadas em duas categorias; as de 1ª categoria são aquelas situadas a uma distância menor de 20 km. de uma estação de estrada de ferro e as de 2ª categoria são as demais. O curso dessas escolas é divido em dois anos os quais são subdivididos em duas seções, sendo que a primeira corresponde ao ensino da leitura e escrita proprimente dito.
[16]Conforme Decreto nº1239 de 30 de setembro de 1904, a Escolas Isoladas são localizadas nos municípios do Interior do Estado pelas respectivas Câmaras Municipais.
[17]Conforme Carneiro, Pinto e Silva, Oliveira e Moraes o ensino intuitivo é aquele que inicia o ensino da leitura pela observação dos objetos (Carneiro et alii, 1912, p.3). Nas palavras de Carvalho, o método intuitivo era “...peça central nas estratégias republicanas de constituição de um sistema de educação pública modelar em São Paulo - demonstrando tratar-se de método fundado no princípio de que a educação deveria recapitular, no indivíduo, o processo de evolução da humanidade (Carvalho, 1997, p.281).
[18]Conforme observação feita por João Kopke em seu livro: “O Curso sistemático de língua materna, compor-se-á de seis partes, relativa cada uma aos livros da Série Rangel Pestana...” Assim o 1º Livro de Leitura Instrutivas e Morais, iniciaria o curso de língua materna. Informações a respeito de como deve ser ministrado um curso de língua materna, são fornecidas pelo artigo O ensino da língua materna de C. Braga publicado pela edição de março, 1913, ano XI, nº4 da Revista de Ensino.
[19]Cf. Carvalho, (1997) a Carteira Biográfica Escolar foi elaborada por Ugo Pizzoli, Diretor da Escola Normal de Modena e catedrático da Universidade da mesma cidade. Pizzoli foi convidado por Thompson para ensinar ao professor da Escola Normal de São Paulo, como proceder nos estudos e manejo dos instrumentos usados nas pesquisas de caráter psíquico. “A carteira deveria ser generalizada a todos os grupos escolares e abranger registros acerca da vida do aluno nos cinco anos de curso. Deveria ser elaborada e assinada pelo diretor do estabelecimento, pelos professores das classes e pelo médico escolar. (...) Constando de nove páginas, a Carteira reunia fotografias anuais do aluno e inúmeros registros de mensurações resultantes de ‘observações antropológicas’ e ‘fisio-psicológicas’ , além de anotações registradas como ‘dados anamnésticos da família’ e ‘notas anamnésticas’, estas últimas obtidas por exame médico” (Carvalho, 1997, p. 273)